A produção das artes cênicas na região do Cariri vive um momento de efervescência. Em relação a prêmios, editais e incentivos à cultura, os cerca de 40 grupos teatrais atuantes estão se organizando para alcançar um nível de igualdade com os nacionalmente reconhecidos.
Como mecanismos de produção cultural, atualmente, os produtores contam com as qualificações técnicas oferecidas pelo curso de teatro da Universidade Regional do Cariri (Urca) e os equipamentos disponíveis nos centros culturais e teatros. Para ampliar o campo de atuação, alguns artistas buscam levar suas produções para as capitais, onde participam de festivais ligados à área.
Mesmo com bons espetáculos, de acordo com os envolvidos, a maior dificuldade regional ainda é a formação de uma plateia consciente sobre os investimentos nas obras. Entretanto, a cada apresentação, os atores tentam formar uma novo conhecimento através de informações sobre a função da arte.
Premiação
Premiada pela pesquisa que deu origem ao texto, na Mostra Inéditos e Dispersos, realizada pela Associação dos Amigos do Teatro José de Alencar, a peça teatral "A Irmandade Secreta do Boi Santo" foi contemplada recentemente pelo edital de ocupação do Centro Cultural Banco do Nordeste do Cariri (CCBNB), que, de acordo com a Lei de Incentivo à Cultura, oferece espetáculos gratuitos. Nos próximos dias 11 e 18, a peça poderá ser conferida. Ainda haverá apresentações de várias companhia do Nordeste. Entre as contempladas estão a Cia Ortaet de Teatro, de Iguatu, e a Scenas, vinda de Olinda no Estado de Pernambuco.
Apesar do mix entre religiosidade e teatro já ter sido bastante abordado nas produções regionais, "A Irmandade Secreta do Boi Santo" apresenta um olhar diferenciado sobre a cultura caririense e a formação de seu povo. A peça retrata pontos que a história oficial não contempla, como a cultura do índio e do negro, suas crenças, rituais e práticas que são reveladas por meio de um sincretismo teatral.
Na apresentação, as atividades da religião católica mais uma vez vem à tona. Mas, a figura do Padre Cícero Romão Batista não se manifesta apenas na fé, e sim na relação entre o líder católico e os remanescentes da terra. O espetáculo provoca reflexões sobre o afastamento do beato José Lourenço das atividades da Igreja Católica na sede das cidades, a presença do Boi Mansinho no Sítio Caldeirão do Deserto e as práticas de fé atribuídas a ele. Além do ponto de vista dos políticos e da sociedade da época quanto à adoração ao animal.
Para o escritor e ator André Andrade, "A Irmandade Secreta do Boi Santo" quebra paradigmas. "O espetáculo apresenta as crenças da etnias com igual valor e importância cultural", diz.
"A Irmandade Secreta do Boi Santo" foi lançada ainda em 2011, dentro das comemorações do centenário de Juazeiro do Norte, com o intuito de mostrar um ponto de vista histórico diferente do que estava sendo abordado na ocasião.
A peça já participou do Festival de Teatro de Acopiara, da Guerrilha do Ato Dramático, militância dos grupos teatrais da região do Cariri no sentido de fortalecer a identidade cultural das artes cênicas. Além de ter sido vista no Teatro José de Alencar e no CCBNB, em Fortaleza. Estima-se que mais de mil pessoas já assistiram ao espetáculo, que é um solo teatral, onde o ator interpreta quatro personagens, que são o beato José Lourenço, uma romeira fanática, um corifeu e a personificação do Boi Mansinho.
Os elementos da composição do texto se baseiam na cultura popular. Retrata a lenda da pedra da Batateira, que versa sobre a cresça de que o Cariri é um mar encantado que existe embaixo da chapada do Araripe e que deu origem a expressão "O sertão vai virar mar", proferida pelo líder espiritual Antônio Conselheiro.
"A Irmandade Secreta do Boi Santo" faz referência, ainda, aos benditos de romarias e a fatos históricos que envolvem a beata Maria de Araújo, o Padre Cícero e o milagre da hóstia. O espetáculo contrasta e aproxima as divindades religiosas.
YAÇANÃ NEPONUCENA
REPÓRTER
Fonte: Miséria
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