F-1: Falta de base, patrocínio e questão emocional atrapalham brasileiros

O fim da união de oito anos entre Felipe Massa e a Ferrari – anunciado esta semana pelo piloto e pela escuderia – significa outra separação ainda mais drástica para o automobilismo brasileiro: pela primeira vez, desde 1968, pode haver um grid de Fórmula 1 sem a presença de pilotos nacionais.

As esperanças recaem no próprio Massa, que busca uma equipe menor mas já tem a concorrência do alemão Nico Hulkenberg  na Lotus – ou a ascensão de outro Felipe, o Nasr, de 22 anos, que disputa a GP2 na Europa. Mesmo que uma das opções se concretize, outro tabu será mantido: desde 2009, com Rubens Barrichello, pilotos brasileiros não vencem uma corrida de Fórmula 1.

Amir Nasr, tio e empresário de Felipe, não tem dúvida sobre o principal motivo da decadência brasileira na mais importante categoria do automobilismo. "Antigamente, um piloto começava no kart e em seguida ia para categorias-escola, como a Fórmula Ford, Fórmula Chevrolet ou Renault. Hoje, não existem mais e o garoto que sonha com a Fórmula 1 precisa se aventurar na Europa ainda sem ter uma base técnica bem formada."

Não é só isso. Questões emocionais atrapalham também. "Meu sobrinho sofreu com isso. Foi para a Europa com 16 anos e sentiu, como todo mundo sentiria, ficar longe da família, dos amigos, da namorada. Vou dar um exemplo bem simples. Ele podia disputar corridas, mas não podia alugar um carro para se deslocar. Tudo isso atrapalha na disputa com outros pilotos. Muitos sucumbem já aí".

Para Carlos Col, engenheiro que dirigiu a Stock Car de 1999 a 2012, transformando a categoria de um reduto de pilotos aposentados em algo muito mais profissional, a falta de categorias escola tende a fortalecer os campeonatos de turismo. "Hoje, um piloto de Stock Car ganha salários de R$ 500 mil a R$ 1 milhão por ano. Há um mercado forte, para pilotos, preparadores de carro, mecânicos. Por que o cara vai se aventurar na Europa se pode ficar aqui. Em vez de gastar, vai ganhar."

Cotado como provável candidato à presidência da CBA (Confederação Brasileira de Automobilismo) em 2017, Col diz acreditar que, se algo não for feito rapidamente, não haverá mais pilotos brasileiros para correr na Europa. "A verdade é que as categorias-escola precisam de um grande investimento e não dão um grande retorno. Alguém precisa bancar para que novos pilotos surjam. E quem precisa bancar, sem dúvida, é a Confederação Brasileira de Automobilismo. Essa é a sua função. Caso contrário, vamos seguir o exemplo da Argentina, com o turismo sendo a salvação do automobilismo. Eles lotam autódromos para ver as categorias TC e TC 2000 e nem sonham mais com Fórmula 1"

Nasr concorda, mas com uma agravante. "A situação é mais grave. Se não voltar a haver uma categoria em que pilotos de kart possam fazer sua iniciação, vai faltar piloto até para a Stock, não é só para a Fórmula 1".

Ele cita o exemplo do desenvolvimento do automobilismo alemão. "Nada é por acaso. Os alemães tinham a Mercedes e a BMW e não tinham piloto na Fórmula-1. Criaram, então, uma categoria chamada Fórmula ADAC, que é patrocinada pela confederação deles. É como se fosse uma Fórmula CBA. Isso é anterior ao Schumacher e veja quantos pilotos foram aparecendo, até do time júnior da Mercedes. O Vettel está aí, quebrando recordes e mais recordes. É contra pilotos assim que o garoto brasileiro chega na Europa para competir. É um grande choque".

Cleyton Pinteiro, de Pernambuco, foi eleito presidente da CBA em 2013. Ele concorda com o diagnóstico de Col e Nasr, mas exime sua gestão de culpa. "Vou falar por itens, de forma bem didática. A falta de categoria escola faz mal para o automobilismo brasileiro? Faz. É uma categoria que necessita de investimento e que em pouco retorno? Correto. Precisava ser bancada? Precisava. A CBA é que devia bancar? Correto. Só que não tem dinheiro. Só isso. É necessário mais de R$ 2 milhões por ano e não temos dinheiro. A conta não fecha. Se alguém quiser bancar, eu faço tudo para ajudar".

Pinteiro, Col e Nasr concordam ao apontar outro impedimento para que pilotos brasileiros cheguem à Fórmula 1 "Hoje, em dia, precisa levar patrocinador. Por que o México tem dois pilotos? Porque a Claro, que é mexicana, garante. O Maldonado, da Venezuela, é bom, mas se não fosse o Chavez bancar através da PDVSA, não chegaria lá, não", diz Pinteiro. "Realmente, sem dinheiro não se chega à Fórmula 1. Não basta ter os garotos formados pelas equipes, como Vettel, Hamilton e agora o Ricciardo. Precisa ter dinheiro", lamenta Col.

O exemplo de Nasr é mais ilustrativo. "O Alonso é bom? É ótimo, mas o Santander é melhor. Se não fosse assim, o Alonso iria mostrar sua destreza longe da Ferrari".

Fonte: UOL



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