Pobreza aumenta no Brasil e já atinge 55 milhões

A recessão que atingiu o Brasil nos últimos anos aumentou não apenas o número de pobres no país, mas também a intensidade da pobreza. Segundo dados divulgados nesta quarta-feira pelo IBGE, o Brasil tinha no ano passado 54,8 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, segundo critério usado pelo Banco Mundial, que considera um rendimento de até US$ 5,5 por dia. A mais recente Síntese de Indicadores Sociais do instituto mostra que seria necessário um investimento adicional de cerca de R$ 10,2 bilhões todo mês para tirar os brasileiros dessa condição, ou R$ 187 mensais por pessoa.

— Um projeto de erradicação da pobreza depende de muitas decisões. Subsidiar o custo com moradia e alimentação, gerar empregos, tudo isso pode ser contemplado. Mas, se você quiser resolver esse problema amanhã, numa canetada, esse seria o montante adicional necessário a ser investido — disse Leonardo Queiroz Athias, analista da Coordenação de População e Indicadores Sociais do IBGE.

Para especialistas, esse esforço financeiro é impossível em meio ao cenário de necessidade de ajuste fiscal que o país vive.

- Já temos um déficit primário de R$ 140 bilhões. Isso implicaria em praticamente duplicar esse valor. É um esforço razoavelmente grande. Mas, a partir do momento que você passa a ter um um crescimento econômico maior e sustentável, que passa a gerar empregos de qualidade e renda para as famílias, esse esforço adicional diminiu - avalia o sociólogo especialista em políticas sociais e professor do Instituto Brasileiro de Direito Público (IDP), Luis Henrique da Silva de Paiva.

Os números do IBGE mostram ainda, que a pobreza no país ficou mais intensa.  Em 2016, a renda mensal média dos pobres no Brasil era R$ 183 inferior ao patamar mínimo que define a linha de pobreza. No ano passado, a distância ficou maior, em R$ 187 - e é este valor, multiplicado pelo número de pobres, que resulta no esforço necessário de R$ 10,2 bilhões por mês para erradicar a pobreza.

Em 2016, o Brasil tinha 2 milhões a menos de pobres, com uma renda média ligeiramente maior. Naquele ano, segundo o IBGE, o esforço necessário para tirar esse grupo da pobreza seria um pouco menor, de R$ 9,95 bilhões mensais. Segundo o instituto, esse montante trata-se de um cálculo aproximado, pois considera a alocação de recursos, sem custos operacionais e sem eventuais efeitos inflacionários desse investimento.

Dos 55 milhões de pessoas vivendo em condições de pobreza, 15 milhões estão em situação ainda pior: abaixo da linha de pobreza extrema. Ou seja, vivem com renda inferior a US$ 1,90 por dia, de acordo com o Banco Mundial. Em números absolutos, esse contingente aumentou de 13,5 milhões em 2016 para 15,2 milhões de pessoas em 2017. O esforço econômico para tirar essa grupo da extrema pobreza é um pouco menor, de R$ 1,17 bilhões mensais.

A família de Glaucia Milani Pereira Ribeiro, de 32 anos é uma delas. Vive em uma casa de quatro cômodos, com os cinco filhos e o marido em uma comunidade de Santa Cruz, Zona Oeste do Rio. Dividem o terreno com mais duas famílias. Têm uma renda que dificilmente ultrapassa os R$ 1.000. Mais da metade vem do Bolsa Família, principal programa federal de combate à pobreza. O restante é de pensões pagas pelos pais dos filhos. Ela e o esposo fazem bicos, mas se tornaram raros. Ele como ajudante de obra e auxiliar de serviços gerais e ela como faxineira e manicure.

- Quando o bolso aperta, sentamos e conversamos com eles (os filhos) para explicar que não vai ter iogurte ou biscoito. Só o que enche barriga mesmo, para as refeições. Mas, quando conseguimos bicos, a gente compra para fazer a alegrias deles - conta Glaucia.

À exceção da mais nova, que tem um ano e dez meses, as outras quatro crianças, de 7,9,11 e 13, vão à escola e têm boas notas. A mais velha, Maria Eduarda, quer fazer Enfermagem. Assim que Nicolly, a mais nova, for para a creche, Glaucia quer voltar a estudar por meio de apostilas e fazer um curso profissionalizante. Sabe que, só assim, pode aumentar as chances de conseguir emprego.

Francisco Menezes, economista do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e analista de Políticas e Programas da ActionAid diz que o crescimento da pobreza ocorreu via retrocesso econômico das famílias:

- Houve uma migração daqueles que estavam acima da linha da pobreza para baixo dela, sobretudo causada pelo desemprego. E outros tantos na pobreza migraram para a condição extrema. São pessoas que, do dia para a noite, viram sua renda serem reduzidas a 0.

Ele não vê, no entanto, espaço para aumento orçamentário do Bolsa Família, principal programa federal de combate à pobreza, sem a revogação da Emenda Constitucional nº 95, também conhecida como Teto dos Gastos, que congela investimentos públicos. Para 2019, o orçamento do Bolsa Família está estimado em R$ 30 bilhões.

- Para além do Bolsa Família, precisamos de um projeto de país com políticas que emancipem de forma duradoura as pessoas dessa condição. Seja pela educação, por condições dignas de emprego e através de uma reforma tributária justa. Isso não pode ser postergado - diz Menezes.

28% da população sem acesso à educação
No Brasil, em 2017, ao menos 16% da população ou 33 milhões de pessoas eram atingidas pela pobreza dimensional, que mede a falta de acesso à educação, proteção social, moradia, serviços de saneamento básico e internet. Segundo o IBGE, integra esse grupo os brasileiros que têm ao menos três restrições a esses direitos básicos que garantem maior cidadania.

Os dois maiores grupos são os do sem acesso a saneamento básico -  37% dos brasileiros não morava em lares que contavam, simultaneamente, com coleta de lixo, de esgoto e água encanada - e educação - 28,2% da população ou são crianças de 6 a 14 anos fora de escola ou pessoas com mais de 14 anos analfabetas ou acima de 15 anos sem o ensino fundamental completo.

Marcelo Neri, diretor da FGV Social, considera os dados preocupantes:

- A falta de ao menos três dimensões de ativos é seria. A educação é o principal determinante da evolução prospectiva dos indicadores sociais. E, se uma comunidade não tem saneamento, terá uma incidência maior de doenças, o que dificulta o trabalho, e mais mortalidade infantil. Além disse, há um paradoxo interessante. O ativo que mais avança é o acesso à internet, a marca do século XXI, e o mais estagnado é o esgoto algo do século XIX. 

Fonte: O Globo

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