Sem planos de gestão, Ceará gera, por dia, 14 mil toneladas de lixo

O mau costume de descartar o lixo inadequadamente, associado à deficiência de ações públicas para coletá-lo e destiná-lo de forma correta, fizeram do Ceará um Estado poluído. De acordo com o mais recente Panorama dos Resíduos Sólidos do Brasil, realizado em 2012 pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), a quantidade de lixo produzido o coloca em 5º lugar no ranking nacional de geração de resíduos, ficando atrás apenas de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia.

Por dia, o Estado origina exorbitantes 14.233 toneladas de detritos. No mesmo intervalo de tempo, cada habitante joga fora cerca de 2,3kg de lixo. Como esse material é recolhido e o que é feito com ele, no entanto, não segue nenhum tipo de diretriz. Não há plano estadual de gestão de resíduos e apenas 27 cidades possuem procedimentos definidos sobre o manejo e a destinação do lixo.

Para a professora do departamento de Construção Civil do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Nájila Alencar, a inexistência de projetos de gestão evidencia o descaso histórico que o Brasil demonstra em relação à questão dos resíduos sólidos.

"A ausência dos instrumentos de gestão, a exemplo dos planos de resíduos sólidos, acarreta na não observância dos condicionantes legais e na carência da efetivação das políticas ambientais", afirma.

Conforme o Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente (Conpam), o Ceará trabalha com um método regionalizado de elaboração de planos de gestão. Os 186 municípios cearenses foram divididos em regiões (Região Metropolitana de Fortaleza - A; Região Metropolitana de Fortaleza; Cariri; Litoral Leste; Litoral Oeste; Maciço de Baturité; Região dos Inhamuns; Chapada da Ibiapaba; Médio Jaguaribe; Sertão Central; Sertão Centro Sul; Sertão Crateús; e Sertão Norte). Cada uma delas deve ter projeto próprio.

Diretrizes
De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, todos os Estados brasileiros tinham até 2013 para concluir o desenvolvimento dos planos. No entanto, boa parte do País não conseguiu cumprir o prazo, inclusive o Ceará. Hoje, somente 27 cidades, 14,5% do total, possuem diretrizes definidas para o tratamento do lixo. Das maiores geradoras - Fortaleza, Juazeiro do Norte e Caucaia - apenas a primeira possui o documento.

A Capital produz, por dia, 5.876 toneladas de lixo e cada habitante descarta em torno de 2,31 kg de material. O plano de gestão municipal foi lançado em 2012 e tem vigência de 20 anos. Mas, embora faça um diagnóstico válido sobre os tipos de resíduos e os geradores mais preocupantes, o projeto carece de um ponto fundamental: metas.

"O plano serviu como documento oficial para cumprir um procedimento do Governo Federal e trouxe benefícios porque temos indicadores para a coleta domiciliar. Mas ele não tem projeções, não tem objetivos. Sem isso, não se chega a lugar nenhum. Agora, estamos fazendo a correção", afirma Albert Gradvohl, coordenador especial de limpeza Urbana da Secretaria de Conservação e Serviços Público (SCSP).

Gradvohl explica que a proposta atual da Prefeitura é criar um sistema de gestão integrado, unindo coleta, transporte e destinação. Segundo ele, os serviços de recolhimento de lixo e coleta seletiva são a chave para que a cidade consiga administrar resíduos adequadamente. Por isso, a SCSP realizou, neste ano, o recadastramento de empresas de coleta particular, a fim de regularizar a situação de firmas que não estavam de acordo com os parâmetros legais.

Catadores
"Também estamos discutindo com o setor produtivo e os catadores (de material reciclável) um projeto para coleta seletiva, montando linhas de incentivo a pequenas e médias empresas de reciclagem. Vamos amadurecer a ideia para implementar ainda neste ano", promete o coordenador da SCSP. Em Caucaia e Juazeiro do Norte, segundo e terceiro municípios, respectivamente, a apresentarem as maiores quantidades de lixo produzidas no Estado do Ceará por dia, não há qualquer plano de gestão que trate da questão.

Ultrapassando Fortaleza, Juazeiro do Norte é a cidade com o mais alto Índice de Geração de Resíduos sólidos Per Capita no Estado. A cada dia, são 3,68 kg de material descartados por habitante. Com isso, o município origina, ao todo, aproximadamente 926 toneladas de lixo diariamente. Em Caucaia, a produção diária é ainda maior - 1.032 toneladas - e o índice é de 3,34 kg/hab.Dia.

Prejuízos
Além dos prejuízos que a falta de projetos que estabeleçam metas para a redução e o melhor reaproveitamento do lixo produzido nas cidades acarreta, a ausência de planos de gestão de resíduos também pode trazer prejuízos orçamentários para os municípios. A pena para as cidades e para os Estados que não desenvolverem o documento em tempo hábil é o impasse para conseguir financiamentos no Governo Federal.

Diante dos riscos, o Ceará tenta correr contra o tempo. Bruno Menezes, presidente do Conpam, garante que, apesar do prazo estourado, o Plano Estadual de Gestão de Resíduos Sólidos está quase concluído. Segundo ele, o projeto já foi elaborado e os consórcios formados, restando a apreciação da Lei Estadual de Resíduos Sólidos pela Procuradoria Geral do Estado do Ceará (PGE/CE) e aprovação pela Assembleia Legislativa do Estado. "Isso tudo deve acontecer ainda neste primeiro semestre", afirma.

Sobre os planos municipais, a coordenadora de Desenvolvimento Sustentável do órgão, Maria Dias Cavalcante, destaca que o Conselho está trabalhando para chegar ao fim deste ano com os documentos em mãos.

Coleta seletiva reduz 40% do lixo nos aterros
Além de dar as bases para uma melhor destinação do lixo, o Plano de Gestão de Resíduos Sólidos deve propor formas de reduzir a quantidade de lixo produzido, como explica Bruno Menezes, presidente do Conpam. Segundo ele, o trabalho coletiva seletiva é fundamental para diminuir a quantidade de resíduos que vai parar nos aterros sanitários. Com ela, é possível reduzir em até 40% o volume nos depósitos. No entanto, Menezes afirma que a separação do lixo é uma responsabilidade compartilhada entre o cidadão e o poder público. "Não adianta a população fazer a separação do material em casa e não ter onde deixar ou vir o caminhão de lixo e juntar tudo. Também não adianta disponibilizar pontos de coleta se não fizerem a separação", diz.

Lixões não serão extintos no prazo
Uma das principais meta estabelecida na Política Nacional de Resíduos Sólidos é a extinção dos lixões em todo o País até agosto deste ano. Os depósitos de lixo a céu aberto fornecem altos riscos de contaminação do solo, do ar e da água, contribuindo, ainda, para a proliferação de vetores e a consequente transmissão de doenças. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Ceará conta com aproximadamente 300 lixões. E, possivelmente, não conseguirá dar fim à prática em tão poucos meses.

Segundo o Conpam, a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) é a única que já atingiu o objetivo e passou a fazer uso dos aterros sanitários como destino final de resíduos. No Interior, o lixão ainda é a alternativa mais utilizada pelos municípios devido aos menores custos de manutenção.

Segundo Bruno Menezes, a Região do Cariri é uma das prioridades na transição dos lixões para os aterros sanitários. A área é a segunda maior geradora de resíduos sólidos do Estado, com 1.831 toneladas diárias de lixo. Entretanto, todo esse volume é depositado de forma inadequada. "O Governo do Estado está incentivando os municípios. Se for o caso, vamos pagar uma parte dos recursos para ter as obras dos primeiro aterro sanitário com base nos consórcios. Mas no prazo que nos foi dado, é muito difícil que consigamos atender", afirma Menezes.

O presidente do Conpam destaca, ainda, que o problema é nacional e que se espera uma flexibilização do prazo. "Infelizmente, o meio ambiente sofre, porque os gestores dizem que precisam cuidar da educação, da saúde, e o meio ambiente é deixado de lado", opina.


VANESSA MADEIRA 
REPÓRTER

Fonte: Diário do Nordeste


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