Órgãos do ES investigam Telexfree por golpes disfarçados de investimentos

A suspeita de golpes financeiros disfarçados de investimentos é investigada na empresa Telexfree, com sede no Espírito Santo, pela Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor (Senacon), órgão vinculado ao Ministério da Justiça (MJ), pelo Ministério Público Estadual (MP-ES) e pela Polícia Civil. A firma vende um programa de computador que permite ligações locais, de DDD e DDI ilimitadas e, para tornar o serviço conhecido, oferece dinheiro para internautas criarem anúncios gratuitos na web. A Delegacia de Defraudações e Falsificações (Defa) informou que algumas pessoas chegaram a pagar R$ 3 mil para entrar no esquema e reclamaram por não ter o retorno prometido.

O MP-ES informou que recebeu o inquérito da Polícia Civil sobre a atuação da empresa no estado e encaminhou o parecer à Defa, na última sexta-feira (8).  A titular da Defa, Gracimeri Gaviorno, começou a ouvir alguns divulgadores e promotores da empresa. Segundo ela, há relatos de pessoas que pagaram de R$ 300 e até R$ 3 mil em planos de adesão. De acordo com o Ministério da Justiça, a empresa também é investigada pela Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor (Senacon), que apura crimes contra a economia popular e desrespeito às regras do Código de Defesa do Consumidor. A suspeita é da prática de modelo de negócios que se assemelha ao esquema de pirâmide financeira.

A delegada explicou que a promessa de dinheiro fácil enche os olhos das pessoas. "A história de uma mulher me chamou a atenção, pois ela adquiriu um plano, em torno de R$ 3 mil, e tinha 60 dias para chamar mais duas pessoas para integrar seu grupo de divulgadores. Ela acabou falhando, mas adquiriu o plano novamente, pelo mesmo valor, e adicionou a si mesma no grupo, conseguindo a quantia de U$ 100 em cima do próprio dinheiro. Está aí o ponto que me chamou a atenção, pois ela ficou muito contente com isso, apesar de não ter ganhado nada", contou.

Reclamações
O G1 visitou a sede da Telexfree, em Vitória, na manhã desta segunda-feira (11), e, na ocasião, nenhum responsável foi localizado. No prédio, um morador de Rondônia que fez o serviço de divulgador da empresa tentava registrar uma reclamação. Sem querer se identificar, ele disse que não responderam nenhum dos seus contatos e que não recebeu o dinheiro pelo trabalho.

Na internet, também é comum encontrar reclamações sobre a Telexfree vindas de todo o país. O morador de Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco, Fabio de Sanctis, diz que tentou por várias vezes cancelar sua participação na empresa, sem sucesso. "Só consegui resolver através da pessoa que me colocou lá, e não pela empresa. Me senti enganado. Tinham me prometido uma coisa, mas funciona de maneira diferente. Me falaram que bastava US$ 290, que teria retorno, mas depois descobri que teria que colocar duas outras pessoas abaixo de mim e comprar outros pacotes", contou.

O morador de Cuiabá, em Mato Grosso, Carlos Santos, também reclama que não consegue contato com a empresa. "O contrato deles comigo é antigo e agora querem jogar um novo contrato. Não quero isso, mas não consigo entrar em contato com eles. Não recebi nenhuma vez o contato deles”, disse. Fabio de Sanctis acredita que o problema está cada vez mais comum e que a situação deve piorar. "Acho que, sinceramente, uma hora isso vai estourar em algum lugar", disse.

Suposto esquema
A delegada explicou que para o suposto esquema funcionar, há a apresentação de um produto, que nesse caso é o serviço de telefonia VoIP. "Esse produto, na verdade, é uma máscara. As pessoas dizem que aderem planos que dão direito a certo número de divulgações. As que já estão inseridas no esquema precisam convidar outras pessoas, que também vão investir dinheiro e isso vai sustentando quem o convidou. Mas chega uma hora que não dá para incluir mais ninguém na base e a pirâmide rui, gerando muitos prejuízos. Só não tem prejuízo que está no topo, que já ganhou muito dinheiro", explicou.

As primeiras informações sobre o suposto esquema surgiram no estado do Paraná e depois foram enviadas para o Espírito Santo, sede da empresa. De acordo com a delegada, há indicativos de que a Telexfree age em pelo menos seis estados, mas esse número ainda pode aumentar. "Ainda estamos no início das investigações. As pessoas envolvidas, que são responsáveis por esse esquema ilegal ou que sabem que se trata de algo proibido, podem se enquadrar nos casos de crime contra a economia popular e crime de induzimento à especulação", disse.

Telexfree
O advogado da Telexfree, Horst Fuchs , disse ao G1, na manhã desta terça-feira (12), que toda a estrutura do sistema de bonificação da empresa é legal, pagam impostos e tributos corretamente. Disse ainda que a Telexfree está disponível para esclarecimentos à polícia. “As investigações são oportunas. A Telexfree é um dos assuntos mais comentados no Brasil e o resultado dessas investigações serão favoráveis. Estamos esperando uma ação declaratória de um juiz, que pode comprovar que nosso trabalho é totalmente legal. Não existe uma lei no Brasil que diga que o que fazemos é errado”, defendeu.

De acordo com o advogado, a Telexfree foi idealizada por um especialista em marketing, o capixaba Carlos Costa, e inaugurada em fevereiro de 2012, no Boulevard da Praia, em Vitória. Atualmente, a empresa tem aproximadamente 100 funcionários, tem sede oficial no Espírito Santo e está presente em 40 países, como EUA, México, Espanha, Portugal e Canadá.

Serviço
Fuchs  explicou que a empresa trabalha com o serviço de telefonia via internet, chamada VoIP (voz sobre IP). Para isso, recruta pessoas que publicam anúncios do produto em redes sociais e sites. “Uma pessoa qualquer compra pacotes com contas VoIP e revendem cada conta pelo dobro do preço. Quanto mais pacotes, mais linhas e, consequentemente, mais retorno financeiro. Por exemplo, o indivíduo compra um pacote com 10 contas por U$ 289 (dólares), ou seja, U$S 28,90 cada, e pode revender cada uma linha por até U$S 49,90. Obtendo assim, quase 100 % de lucro”, detalhou.

O advogado disse que as pessoas que entram nesse negócio são conhecidas como "divulgadores". No mundo, existem mais de 600 divulgadores da empresa. Desses, 90% são brasileiros. Para ser um divulgador é necessário usar o CPF e pagar uma taxa de adesão de U$ 50 (em média R$ 100).

Ele diz que, em casos raros, o divulgador consegue vender muitas contas e consegue arrecadar até R$ 1 milhão em apenas um ano. “Para isso é preciso um grande desempenho e vocação para vender. Nossos grandes divulgadores não trabalham sozinhos, contratam uma equipe e se dedicam a vender as contas Voip. Já a maioria, trabalha sozinha e consegue uma renda mensal de R$ 4 a 8 mil”, disse.

Pirâmide financeira
Na pirâmide financeira, o divulgador faz um pagamento e tem a promessa de recompensa vinda do recrutamento de outras pessoas. No final, o dinheiro percorre a pirâmide e, apenas os indivíduos que estão na ponta do negócio - o idealizador e poucos investidores - ganham. As pessoas que estão na base do esquema assinam o plano, mas não são capazes de recrutar seguidores.

Para o economista e membro do Conselho de Economia do Espírito Santo, Sebastião Ballarini, esse tipo de fraude sempre existiu, mas atualmente ganhou força com a internet. “Alguém lança uma ideia e os primeiros que entram no esquema ganham com aqueles que vêm depois. Aqueles que fazem parte do topo da pirâmide servem de chamariz para os outros”, explicou.

O advogado da Telexfree, Horst Fuchs, nega que a empresa se enquadre no esquema criminoso da pirâmide financeira. “Usamos o sistema de 'marketing multinível' que é totalmente lícito. No nosso negócio uma pessoa comum tem um contrato limitado de um ano e para ganhar dinheiro é preciso anunciar o produto. Se não fizer isso, pode não ganhar nada. Na pirâmide, os últimos a entrar no negócio trabalham para enriquecer os primeiros, que já estão com os braços cruzados”, explicou o advogado.

Orientações
O Ministério da Justiça divulgou um boletim publicado pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor e pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que coloca em pauta golpes financeiros e orienta ao consumidor a não cair em fraudes.

De acordo com o boletim, estar bem informado é o primeiro passo para escapar dos investimentos irregulares. É preciso investigar bem antes de investir: procure conhecer o mercado, a formação do investidor é uma atividade permanente. Além dos recursos oferecidos pelos participantes do mercado, consulte a área educacional do site da CVM - Proteção e Educação ao Investidor - ou o Portal do Investidor.

O documento ainda orienta a proteger a informações, como as senhas por exemplo, e desconfiar das promessas de retornos elevados com baixo risco. “Rentabilidade e risco andam de mãos dadas. Se é bom demais pra ser verdade, provavelmente não é”, alerta o boletim.

De acordo com o Ministério da Justiça, em caso de irregularidades, o consumidor deve apresentar uma denúncia ou reclamação à CVM. As demandas podem ser encaminhadas por meio do Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC), no link “Fale com a CVM”. A comissão vai investigar a reclamação, podendo aplicar as penalidades previstas em lei.

Fonte: G1



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