Lapinhas vivas mantêm ritual de saudação natalina no Cariri

Um ritual de saudação natalina que se estende até o Dia de Reis é tradição de mais de cem anos no Cariri, com as lapinhas vivas. Algumas com características diferenciadas de personagens, mas todas seguem os rituais da religiosidade, fortalecidos na região pela presença do Padre Cícero.

Uma delas é a Lapinha Santa Clara, de Maria Pereira da Silva, a dona Tatai, mestre da Cultura falecida em 2009. São 102 anos de apresentações pelas ruas de Juazeiro do Norte. Com uma característica maior de pastoreio, traz o colorido herdado de Estados como o Pernambuco e Rio Grande do Norte.

Em Crato, as lapinhas da Mãe Celina, no Muriti, e da mestre Zulene Galdino todos os anos realizam apresentações. Hoje, a mestre fará apresentação do seu grupo no terreiro de casa, no bairro Novo Horizonte. Poderá fazer uma queima simbólica da Lapinha, que irá acontecer com apresentações no dia 6 de janeiro, às 18 horas, na praça do Cruzeiro, ou de frente à Sé Catedral, em Crato. A Secretaria de Cultura da Cidade prepara um cortejo com os grupos de tradição, envolvendo reisados e bandas cabaçais, para saudações ao dia.

As lapinhas vivas no Cariri, como a de dona Tatai seguem uma tradição herdada de gerações familiares, em sua maioria. Em 1912, dona Teodora Clarindo fez uma apresentação de sua lapinha para o Padre Cícero e ele pediu continuidade do trabalho, para trazer mais alegria para as festas natalinas. Dona Tatai, sua filha, deu continuidade.

Foram inúmeras apresentações, com cortejo pela Cidade e premiações pelo trabalho. Na sala da residência onde morou por vários anos, na rua Santa Clara, a filha de Tatai, Wanda Pereira da Silva, juntamente com o seu marido, Damião Felipe, guarda com zelo os troféus, medalhas, certificados e lembranças da matriarca. Alguns deles são raridade para a família, a exemplo do menino Jesus de cerâmica francesa e olho de vidro, e um quadro do coração de Jesus, ofertados pelo Padre Cícero.

O trabalho para reunir cerca de 40 meninas e meninos, para formar o grupo, com integrantes de vários bairros, inclusive do Salesianos, onde se encontra a maioria das pastorinhas, não é pouco. Damião pensa nos mínimos detalhes. No primeiro momento, logo que dona Tatai faleceu, ele decidiu com Wanda dar continuidade à lapinha. Esteve por um tempo desanimado pela falta de apoio e chegou a sonhar com dona Tatai pedindo que desse continuidade ao legado que herdou da mãe, pelo menos com seis personagens. "Na verdade, quando a gente começa um trabalho como esse não dá para deixar a tradição se acabar", afirma Damião.

Apoio pequeno
Em Juazeiro do Norte, há cerca de cinco lapinhas, segundo Damião. A maioria delas tem característica de pastoreio. Elas estão espalhadas por vários bairros. Mas ele afirma que o apoio ainda é muito pouco dos órgãos institucionais para manter viva a tradição. Caso os integrantes não aderissem todos os anos em dar continuidade às apresentações, não seria possível manter.

Damião Felipe é agente de saúde e todos os anos investe parte dos seus ganhos de 13º para renovar o guarda-roupa do grupo. Ele chega a criar os modelos com a esposa e costurar os figurinos. Possivelmente, neste ano, a Lapinha Santa Clara faça apresentações em outras cidades. Há a previsão em Brejo Santo. Também houve durante o Natal na Rua Santa Clara, em frente ao memorial de dona Tatai.

Para a mestre da Cultura Zulene Galdino, o importante mesmo é manter a tradição herdade do seu pai, que era um brincante, levando alegria e a religiosidade para as crianças, de forma que elas brinquem e ao mesmo tempo possam conhecer a vida de Jesus e da família sagrada. As crianças se reúnem não apenas durante os dias de apresentação. Grande parte delas está na casa de Zulene praticamente todos os dias, principalmente quando se aproxima a fase de ensaios.

Personagens
Conhecem os personagens e são orientados em relação ao que devem fazer. Eles vão chegando aos poucos e a mestre vai vestindo cada um deles, dando os retoques finais nas meninas e meninos, que assumem os personagens de índias, astros, os reis magos, anjos, animais e pastorinhas. Os cuidados com os que estão começando são essenciais. Uma tarefa que a cada ano Zulene realiza como se fosse única de manter uma tradição, da forma que ela diz que foi iniciada, com a simplicidade do que representa a cristandade.

As lapinhas vivas do Cariri saem às ruas para saudar Jesus até o dia 6 de janeiro. As crianças assumem as personagens, que vão desde anjos, pastorinhas, caboclinhos, astros e animais. A sagrada família formada por Jesus, Maria e José é a protagonista de uma história que, ao longo dos séculos, tem sido encenada.

Em Juazeiro, a lapinha de dona Tatai, depois da primeira apresentação do grupo no Terreiro da Mestre Margarida, no Sesc, segue para a Praça Padre Cícero, onde acontece a tradicional queima de palhas, a partir das 18 horas. Em Crato, haverá cortejo de grupos de tradição nas ruas até a praça da Sé.

Mais informações
Lapinha de Zulene Galdino
Rua Marechal M. De Morais, 81
Novo Horizonte
Crato - CE
Telefone: (88) 3586-2086

ELIZÂNGELA SANTOS
REPORTAGEM E FOTO

Fonte: Diário do Nordeste



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