Crato lidera a comercialização de alimentos orgânicos no Cariri

A produção de alimentos orgânicos deve crescer cerca de 20% neste ano no Brasil. A estimativa é da Associação de Agricultura Orgânica. Entre 2010 e 2015, a média nacional de expansão da atividade foi de 20%. Não há números do Ceará, mas o Estado deve seguir essa tendência nacional. Há também expansão, no Ceará, da produção agroecológica a partir da implantação de tecnologias de convivência com o Semiárido.

No Estado, segundo dados da Comissão da Produção Orgânica (CPOrg), as principais regiões produtoras são Serra da Ibiapaba (frutas e hortaliças), Maciço de Baturité (algodão e mel) e Cariri (mel). "Há cerca de 850 produtores orgânicos no Ceará e 400 têm a apicultura como principal atividade", destacou o secretário-executivo da CPOrg, Adriano Custódio.

Entraves
A crise econômica, a escassez de água, a falta de assistência técnica e de organização para comercialização são os principais entraves que a produção orgânica e agroecológica enfrentam no Semiárido. Apesar de dispor de uma legislação nacional, nos últimos seis anos, as políticas públicas ainda não saíram do papel para a transição de um modelo agropecuário convencional para um sistema autossustentável na agricultura familiar.

O mercado é promissor, a demanda é elevada por produtos cultivados livres de agrotóxicos. Afinal, cresce entre os consumidores o desejo de levar para a mesa frutas e verduras de boa qualidade, sem veneno, mesmo que o preço seja superior a 30%, em média.

"Os maiores desafios para a produção orgânica no Ceará estão no alto custo da certificação, visto que não há entidades certificadoras no Estado", observa Custódio. "Além disso, há poucos locais de comercialização direta". O número de feiras é reduzido, em comparação com outras regiões do País.

Diferença
É preciso diferenciar a produção orgânica da agroecológica, expressão que vem ganhando espaço nos últimos anos. O modelo orgânico seria mais limitado em relação ao conceito da Agroecologia, que vai além do sistema produtivo.

Na produção orgânica, que é certificada, não se usa agrotóxico, não há queimadas, os defensivos são naturais, mas os insumos (inclusive sementes) podem ser adquiridos de empresas e pode-se optar por monocultura. No modelo agroecológico há uma perspectiva mais ampla, uma preocupação com aspectos sociais, culturais, ecológicos e econômicos da agricultura familiar, que vai além da produção. Aqui também não se usa veneno. Os defensivos são naturais, mas com prioridade para obtenção na própria unidade e implantação de um sistema de policultura, criação de pequenos animais, uma integração total do ciclo produtivo.

"É importante a diferenciação desses dois conceitos, definidos na política nacional de produção orgânica e agroecológica", observa a coordenadora do Centro de Estudos do Trabalho e Assessoria ao Trabalhador (Cetra), Cristina Nascimento, que também coordena a Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA). "Um não se opõe ao outro", completa.

O engenheiro agrônomo e diretor da organização não governamental (ONG) Rio Jaguaribe, Paulo Maciel, observa que a produção orgânica está inserida no conceito mais amplo, que é a Agroecologia. "Se for somente a substituição de insumos químicos por naturais e o não uso de agrotóxicos, tende a se afastar da ideia da Agroecologia", frisa. "A produção no sistema agroecológico é mais ampla e envolve aspectos sociais, econômicos, ambientais", explica.

Os produtos comercializados como orgânicos têm de ter um selo de certificação com nome do responsável, endereço da unidade produtiva, número de cadastro, nome da empresa certificadora e logomarca do Selo Orgânico Brasil. "A produção orgânica cresce no Ceará em índices até maiores que a média nacional, embora tenha ocorrido restrição nos últimos dois anos por causa do atual ciclo de seca", observa a diretora técnica da Associação para o Desenvolvimento da Agropecuária Orgânica (Adao), Regina Santiago.

Feiras
Todas as terças-feiras, pela manhã, no Mercado dos Pinhões, em Fortaleza, ocorre, desde 1997, de forma ininterrupta a feirinha orgânica promovida pela Adao e que reúne atualmente nove produtores, sendo dois de hortaliças, oriundos de Guaraciaba do Norte, cidade da Serra da Ibiapaba, e os demais de municípios diversos da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).

Em 2016, a feira de orgânicos da Adao comercializou cerca de 80 toneladas de verduras, frutas e legumes. "Os nossos produtos são certificados e oferecemos a vantagem da comercialização direta entre produtores e consumidores, com preço mais baixo do que os alimentos da agricultura convencional em supermercado", observou Regina Santiago. "Ninguém quer mais comer veneno e, se tiver opção, prefere o orgânico".

O mercado é, portanto, muito favorável aos sistemas produtivos agroecológicos, com ou sem certificação. "São modelos complementares, que favorecem à saúde dos consumidores, protegem o meio ambiente, melhoram a qualidade de vida da família do produtor com maior renda", destaca Regina Santiago. "Há uma melhoria total, nos aspectos de renda familiar, da ecologia, das relações sociais e de trabalho", afirma.

Limitações
Os técnicos observam, entretanto, que ainda é tímido o modelo agroecológico no Interior cearense. O seu surgimento está associado à implantação de tecnologias de convivência com o Semiárido, como cisternas calçadão e de enxurrada e projetos de reúso de água. "Precisamos ampliar essa produção. Mas, para isso, é preciso a aplicação de políticas públicas, assistência técnica, liberação de crédito e organização do espaço de comercialização", frisou Cristina Nascimento. "Em relação à demanda, a produção é reduzida, mas não é fácil e rápida a transição do modelo convencional para a Agroecologia, que tem base familiar e vai de encontro à lógica do desenvolvimento rural tradicional, que privilegia o agronegócio".

Assessoria
O Cetra desenvolve trabalho de assessoria aos produtores de base familiar agroecológica em cidades da região Norte, no entorno de Itapipoca e no Sertão Central. A entidade relaciona dez feiras que ocorrem em várias cidades de área de sua atuação. "As feirinhas têm caráter popular e oferecem verduras e frutas sem veneno, permitindo acesso à população de um modo geral", lembra Cristina.

Na região do Cariri cearense, a Associação Cristã de Base (ACB) desenvolve um trabalho de acompanhamento aos agricultores de base familiar há 35 anos. "O nosso esforço foi sempre para mudar a realidade no campo, reduzir a pobreza extrema, dar vida digna para as famílias, com acesso à educação, saúde, água, energia e segurança alimentar", observa a coordenadora da entidade, Maria do Socorro Silva. "O cenário atual mudou. Não foi fácil. Agora a nossa preocupação é gerar renda para essas pessoas, em particular para os jovens", diz.

Nos últimos 14 anos, a ACB articula um trabalho de orientação aos agricultores familiares para a produção no modelo agroecológico e promove, todas as sextas-feiras, uma feirinha, na cidade do Crato, que reúne 20 produtores. "Começamos com seis", lembra Maria do Socorro.

Estima-se uma renda mensal em torno de meio salário mínimo para cada família produtora que participa do espaço de comercialização da ACB. No Cariri, além de Crato há feiras semanais regulares nas cidades de Santana do Cariri, Milagres e Caririaçu. "É possível ter uma produção diversificada, com uso de defensivos naturais, oferecendo à população uma alimentação saudável", diz Maria do Socorro.

HONÓRIO BARBOSA
COLABORADOR

Fonte: Diário do Nordeste

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