Artista plástica carioca promove intercâmbio cultural no Cariri

O Cariri é uma região de riqueza inenarrável. Seja nas belezas naturais, ou naquelas que nascem das mãos talentosas do povo caririense, a região atrai olhares e desperta curiosidade de milhares de turistas que, ao chegarem na região, promovem uma espécie de hibridismo cultural, com trocas de conhecimentos e experiências que enriquecem ainda mais o local.

A artista plástica Carolê Marques, formada em Programação Visual pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é uma das tantas que se inspirou na singularidade do Cariri para desenvolver sua arte. Há sete anos, ela trabalha com design de peças artesanais, bordados e jacquard. As rendas, uma marca bastante presente em Santana do Cariri, através da Associação de Rendeiras do Birlo, também faz parte do leque de atuação da artista carioca.

"Minhas inspirações estão diretamente ligadas ao Nordeste. Arte, artesanato, poesia, música brasileira, enfim, tudo isso me incentiva a criar. Portanto, pesquiso e estudos bastante várias regiões do Brasil. O Cariri já era uma vontade antiga minha que se concretizou nesse ano", conta Carolê, ao confidencializar que a "riqueza cultural, folguedos, costumes, cordéis e lendas" atraíram-na.

Marcas
Durante sua estadia, a artista fez inúmeras intervenções pela região, sendo três delas mais marcantes e em grande escala. A primeira delas está a beira da rodovia que liga os municípios de Nova Olinda e Crato. Quem passa pelo local facilmente se encanta com a humilde casa de taipa que ostenta uma pintura singular nas paredes de fora. O trabalho feito por Carolê virou, inclusive, uma espécie de ponto turístico. "As pessoas olham, se admiram e param o carro para fotografar", conta a moradora Josefa Sebastiana Oliveira.

"Sempre busquei paredes ruidosas para intervir. Visualmente, é isso que me aproxima da rendeira, pois a parede ruidosa traz uma rigidez e uma dificuldade que faz analogia com o trabalho intenso e paciente de quem faz renda", explica.

Representatividade
A escolha pelos traçados mais finos, que se aproxima da renda de bilro do litoral cearense, também atua em similitude ligação com o trabalho das rendeiras de Santana do Cariri, apesarem de terem um traçado mais grosso, porém, com peças igualmente delicadas. "São mulheres que atuam com uma força e uma garra tão grande e, ao mesmo tempo, tem que chegar no resultado tão delicado que é a renda", lembrou.

Carolê também fez intervenção semelhante na casa do Mestre Antônio Luiz, um dos principais símbolos do Reisado em Potengi, cidade única no Cariri onde se tem a característica do uso de máscaras ou caretas, e na Organização Não-Governamental Beatos, em Crato. "Essa ONG me tocou muito pela vivência e a convivência de culturas e pessoas em um mesmo local", pontuou.

O resultado final das obras, conforme conta, foi uma forma de agradecimento. "A imersão foi tão grande, que eu precisei me expressar artisticamente na região. Eu senti a necessidade de criar e intervir, além do mais, era um sonho fazer intervenções desse tipo, com em casas com rachaduras em barro", acrescentou Marques.

Hibridismo
Para além da beleza registrada em forma de pintura nas paredes que se transformaram em quadros gigantes, durante suas intervenções, a artista dialogava com os moradores das comunidades. A troca de experiências e vivências, é considerada, pelo professor doutor em Artes Visuais Fábio José Rodrigues da Costa, "importante para o enriquecimento da região e do seu povo".

"O Cariri cearense tem se constituído em lugares de convergência de artistas, pesquisadores, curadores, historiadores da arte que olham de dentro para fora e de fora para dentro. Nesse sentido, essa terra de culturas aprende e ensina, dialoga, expressa e pauta questões de seu tempo, de seu tempo histórico", pondera Fábio, que também é diretor do Centro de Artes da URCA.

Conforme avalia a artista, a imersão possibilita um conhecimento "muito além das pesquisas feitas friamente à distância". "Nosso trabalho, quando é feito imerso em outra cultura, possibilita interpretar, através das estampas de renda, por exemplo, as linguagens, cultura, expressões artísticas e tantas outras manifestações próprias", pontua.

OPINIÃO DO ESPECIALISTA
O Cariri é por sua própria história um lugar de muitas culturas e, consequentemente, de multiculturalidades. Como as culturas são o resultado das interações entre sujeitos, cada cidade do Cariri apresenta por meio de visualidades, corporalidades, sonoridades e gestualidades suas camadas e camadas de cultura. Essas interações se amplificam quando os sujeitos locais interagem com outros sujeitos que não são nativos e com eles ensinam e aprendem gerando hibridismos culturais que percebemos nos traços das expressões mais tradicionais até aquelas das culturas de massa.

Identifico que o Cariri vem passando por Viradas Culturais, como por exemplo a Mostra SESC de Cultura que desde seu surgimento provocou diálogos interculturais entre artistas locais e artistas das mais diferentes culturas do Brasil e de outros países. Uma segunda Virada Cultural ocorreu com a criação e implantação do Centro Cultural do Banco do Nordeste - CCBNB que desde 2006 tem oferecido um conjunto de atividades provocadoras da fruição, quando na cidade do Juazeiro do Norte, a população passou a frequentar exposições de artistas locais e, fundamentalmente, do Brasil e do exterior. Além de exposições, espetáculos teatrais e de dança se tornaram frequentes e ampliando as possibilidades de formação estético/artística do cidadão.

A terceira Virada Cultural ocorreu com a criação do Centro de Artes da URCA (2008) e a oferta dos Cursos de Licenciatura em Artes Visuais e Licenciatura em Teatro e, hoje, em processo de implantação do Curso de Licenciatura em Dança, além de cursos de extensão em artes audiovisuais, teatro, dança, artes visuais, história da arte e curadoria. Essa Virada tem como característica a formação de artistas no próprio Cariri sendo a cidade de Juazeiro do Norte o lugar de convergência uma vez que o Centro de Artes funciona nesta cidade. A formação do artista/professor/pesquisador é fundamental para que os diálogos interculturais e interterritoriais possam acontecer porque uma das características da Arte Contemporânea é sua abertura para a interpretação.

Fábio José Rodrigues da Costa
Diretor do Centro de Artes da Urca

ANDRÉ COSTA
COLABORADOR

Fonte: Diário do Nordeste

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