Quem seria o anti-Trump brasileiro? Teríamos coragem de votar nele ou nela?

Não estou dizendo que Trump e Bolsonaro são iguais – muito, mas muito longe disso. Como já disse aqui, Trump é menos tosco do que parece o ''personagem'' Trump. Também não creio que o segundo tenha chances reais em 2018 e acho que, por mais que esteja se movimentando politicamente para construir sua candidatura, talvez não queira perder o foro privilegiado da reeleição certa para deputado federal.

Mas ambos ocuparam um vazio. E surfaram na insatisfação, oferecendo saídas simplistas para um público cansado da elite política, órfão dos benefícios da globalização, cansado de corrupção e que não acompanha as mudanças pelas quais o mundo passa. Um público irritado com o fato do que era ''tradição e costume'' agora ser chamado por ''preconceito, racismo, xenofobia, homofobia'', ou seja, seus nomes reais.

Ambos têm o aparente frescor da novidade – mesmo que suas narrativas estejam no poder desde que os brancos chegaram ao continente americano e passaram a réguas nos indígenas de lá e daqui. Sabem conversar com um público que quer saídas rápidas e fáceis para seus problemas e que precisam de alguém que lhes entregue uma narrativa que lhes faça sentido para poderem tocar suas vidas. Mesmo que essa narrativa seja violenta. Narrativa que os partidos tradicionais solapam em oferecer.

E pelo fato de não precisarem ganhar nada, estão livres para fazer o que for preciso para ganhar. Inclusive ir contra aquilo a dignidade humana.

O interessante, porém, é que a mesma insatisfação com a política tradicional e a mesma crise das narrativas que alçaram a candidatura de Donald Trump à viabilidade, também produziram um Bernie Sanders – praticamente um ''independente'' que correu pelo Partido Democrata. Alguém que não é vinculado à classe política de sempre.

Concordo com a opinião de vários analistas que afirmam que Sanders teria tido mais chance do que Hillary Clinton – perderia nos Estados republicanos, mas ganharia no chamado ''cinturão da ferrugem'', região que viu indústrias e empregos serem transferidos a outros países. Os eleitores desses locais deram votos a Sanders nas primárias democratas mas, depois, apoiaram Trump e não Hillary na eleição.

A esquerda no Brasil terá um representante ou uma representante, em 2018, capaz de aglutinar a insatisfação e defender a plena efetivação dos direitos humanos?

Conseguirá se reorganizar, talvez agora sob as bases dos novos movimentos sociais urbanos, com estruturas arejadas, horizontais e jovens – capazes de fazer frente ao desafio de atuar fora do Estado e, ao mesmo tempo, disputar seu significado e suas prioridades?

Poderá construir uma nova narrativa que desperte o sonho e o engajamento?

Saberá sair do binômio sindicalistas/intelectuais acadêmicos e animar os mais jovens, que foram às ruas em 2013 e, não voltando para defender ou atacar o impeachment, agora ocupam escolas?

Ou estaremos mesmo fadados a mais de uma década de um sombrio macarthismo, repaginado e adaptado, que se desenha adiante com o desmonte de um Estado social que nunca chegou a ser grande coisa e com uma esquerda que apenas derrapa?

Quem seria o Sanders brasileiro?

E teríamos coragem de nele ou preferiríamos a mesma solução da esquerda de sempre?

Por: Leonardo Sakamoto

Fonte: Blog do Sakamoto/UOL

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