Análise :: Julgamento de Dilma Rousseff

Tayyab Mahamud é um reconhecido professor da Universidade de Seattle, com respeitada passagem acadêmica por Índia e Paquistão. Um de seus importantes textos chama-se “Jurisprudência da traição em sucedida: golpes de estado e direito consuetudinário”. Neste trabalho, o professor analisa os golpes de estado ocorridos no fim dos anos 1980 e 1990, em países com tradição de direito costumeiro.

A pergunta central de seu ensaio é sobre como devem os tribunais reagir. Apoiam os usurpadores (este é o termo usado pelo professor)? Resistem? Legitimam os golpes de estado? Para ele, não devem os tribunais legitimar os usurpadores, porém, devem deixar que o sistema político tudo resolva, a fim de que se possa garantir a sobrevivência do tribunal. Tampouco, devem os membros das cortes renunciar a seus postos, já que isso apenas habilitaria novos nomeados, em sintonia com os usurpadores, o que acabaria por comprometer a existência dos tribunais no futuro.

Parece que o STF brasileiro tem seguido o conselho do professor Mahmud. Em 1964 não esboçou reação alguma. Quando expediu ordens de habeas corpus em favor de governadores adversários da ditadura militar, esta aumentou o número de ministros de 11 para 16, com o respaldo do AI2. Daí em diante, a ditadura militar não perderia uma só noite de sono com o que poderia vir do STF.

No recente julgamento da presidenta Dilma Rousseff, o STF simplesmente renunciou ao seu protagonismo de controle de questões políticas, como havia feito em 1992, e lavou as mãos, deixando que golpistas de todas as horas destituíssem uma chefe de Estado e de Governo sem a comprovação de crime de responsabilidade. Noutras palavras: deixou o caminho livre para os usurpadores, apostando numa eventual composição política futura que possa corrigir o passado, preservando o Tribunal... e os nomes de seus integrantes!

O que chamou a atenção foi a novidade de separação das penas impostas à presidente, decidido pelo presidente do STF, e novamente distante da própria jurisprudência do STF. Estamos, então, que a última instância do Judiciário nacional não se vincula ao que ela mesmo decide. Agora, junto com o povo, é o STF também soberano. A retração do STF durante todo o processo de impeachment poderá protegê-lo agora, nas reverências e togas, nos aplausos baratos à grosserias gramaticais proferidas. Perante a história, a conversa será diferente.

Por: Martonio Mont’ Alverne, presidente do Instituto Latino-Americano de Estudos em Direito, Política e Democracia (ILAEDPD)

Fonte: O Povo

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