Defeitos não são do PT, são da sociedade brasileira, diz Mujica sobre crise política

O ex-presidente e agora senador uruguaio José "Pepe" Mujica concedeu entrevista coletiva a blogueiros e mídias alternativas do Brasil na manhã desta quarta-feira (27), em São Paulo, para falar sobre a situação política brasileira e latino-americana e o avanço do conservadorismo. Para ele, não é hora de fazer balanços, mas de "lutar e perseverar", em um momento de crise econômica mundial em que o "maior medo da classe média" é ser tragada e que reservas são usadas para garantir a segurança especulativa do câmbio em vez de serem destinadas a programas sociais.

"Se eu fosse Dilma... Pobre Dilma. Não posso dizer o que eu faria no lugar dela", disse o ex-presidente do Uruguai sobre a crise política brasileira. "A direita tem os meios de comunicação, os defeitos não são do PT. São da sociedade brasileira."

De acordo com Mujica, no dia em que os meios de comunicação estiverem do lado da esquerda política, será um sinal de que a esquerda mudou de lado. Ele lembra que as empresas de comunicação são empresas, que não têm entre seus clientes, "obviamente", "pessoas de esquerda". "Temos que alcançar a maior independência possível da mídia."

Na ausência de uma lei sobre meios de comunicação, sugere Mujica, é preciso encontrar "caminhos alternativos para lutar".

Mujica apontou que a maioria dos progressos sociais consagrados como avanços da humanidade vieram da esquerda. "Apesar de nunca termos triunfado completamente, os únicos derrotados são os que deixam de lutar. A derrota é sentir-se impotente. Não se esqueçam da igualdade. Das oportunidades."

O senador defendeu que os partidos progressistas precisam ser "muito mais horizontais", "menos piramidais", e que a esquerda tem que entender, concordando ou não, que quem faz a história não são homens fenomenais, mas as correntes de ideias representadas por partidos. O senador ressaltou, contudo, a importância de políticos como Hugo Chávez, ex-presidente da Venezuela, morto em 2013. "A história precisa desses loucos, não conheci um homem tão generoso como Chávez."

"Temos uma causa para viver. E a causa é preocupar-se com os demais. A derrota e o triunfo são passageiros", declarou Pepe Mujica. "Não é tão mal que as pessoas vivam melhor. Isso vai passar."

O ex-presidente também falou sobre a relação entre os homens e a política. "O homem é um bicho que não vive em solidão. Provavelmente a civilização começou quando alguém em grande apuro gritou: 'ajudem-me'. Como qualquer animal, temos uma cota de egoísmo saudável", apontou. "O egoísmo e a solidariedade conformam a civilização. A solidariedade enquadra o egoísmo até certo ponto. Somos bons e maus. Vivemos essa contradição. Se fôssemos perfeitos não precisaríamos da política."

"Política não é para fazer dinheiro.Temos que viver como vive a maioria. Não como vive a minoria. Política não deve obedecer o interesse da grana, é coisa que não tem preço, que não se compra", completou Mujica.

A agenda de Mujica no Brasil inclui encontros com o movimento social e participação no Congresso da Confederação Sindical das Américas, que é realizado na capital paulista entre os dias 26 e 29 de abril. A entrevista com blogueiros e mídia alternativa foi realizada por Barão de Itararé, Fundação Perseu Abramo, Confederação Sindical das Américas e Central Única dos Trabalhadores, e transmitida ao vivo na internet.

Aborto e maconha
Mujica também falou sobre a legalização do aborto e da maconha no Uruguai, destacando que seu país "não é milagroso", tem sorte de ser "pequenininho". Ele chamou atenção para o fato de o país ser vanguarda em diversas frentes, como quando reconheceu o voto das mulheres, o divórcio e assegurou direitos sociais à prostituição, entre outras ações.

"É o único país que preserva a exploração das petroleiras, a energia. A telefonia está nas mãos do estado. É um país socialista? Não! É o Uruguai! O aborto foi aprovado nesse rastro. Para salvar vidas de mulheres pobres, que não tem como custear um aborto privado. Foi uma ação contra a discriminação das mulheres pobres. Sabemos que essa política se vai impor no mundo todo."

Sobre a legalização da maconha, atestou: "Não somos a favor de nenhum vício, mas se o mantemos tapado e escondido, não sabemos quem são os viciados e a ajuda que podemos dar. É um problema de saúde. Se fumo um cigarro de maconha, vão me meter na prisão por causa disso? Se começam a andar como zumbis, eu tenho que atender."

Fonte: Jornal do Brasil

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