Crato (CE): Ação preserva arquitetura original de edificações

Edificações históricas de cidades do Cariri estão desaparecendo em ritmo acelerado. O processo, que chama a atenção do designer residente na região há cerca de quatro anos, Rick Seabra, fez com que ele desenvolvesse projetos resgatando as platibandas, que são as faixas superiores das fachadas das casas, no Crato.

Tem sido intensa a destruição desses modelos trabalhados na inspiração do art déco, movimento internacional iniciado, na Europa, no ano de 1910. Ele destaca apenas duas cidades da região na preservação das fachadas e, consequentemente, as platibandas: Barbalha e Santana do Cariri.

Com uma exposição permanente no Museu Histórico do Crato, onde é diretor, com algumas imagens das centenas de levantamentos que realizou no Centro e em bairros da cidade, Rick afirma que esse projeto, denominado "Patrimônio Platibanda", tem a intenção de preservar fundamentalmente o trabalho dos mestres pedreiros.

Cerâmicas
Com a mostra de fotografias "É possível reconstruir", ele apresenta, inclusive, sugestões que elabora para a recuperação de modelos de platibandas para evitar o que chama de "embanheiramento" das cidades, com os modelos tomados apenas por cerâmicas nas fachadas.

O diretor destaca que a beleza das edificações das cidades foi realizada pelos mestres de construção. Nos últimos anos, ele mesmo tem procurando convencer os donos de propriedades, principalmente do Centro do Crato, da importância de poder refazer platibandas, os detalhes com desenhos geométricos e até mesmo com uma leitura pop, como já encontrou em algumas casas na cidade. "Não é algo fácil, mas vejo que é possível principalmente nas casas do Centro", diz.

Com isso, ele tem projetado, por meio de photoshop e design gráfico, resgatar sequências de casas no Centro, seguindo modelos de platibandas que inspiravam os moradores e construtores desde o começo dos anos de 1940. A presença maior tem sido dos modelos dos anos 60.

Alterações
Muitos levantamentos realizados permanecem apenas nas imagens que captou. As mudanças já foram feitas pelos proprietários das casas e edificações, em substituição às platibandas.

Ele lamenta as grandes perdas históricas de uma cidade que poderia ser contemplada favorecendo o turismo local, como a Rua Miguel Limaverde, no Centro, que foi destruída para dar lugar a uma rua mais larga; a casa do Padre Cícero, e a de Barbara de Alencar.

Mas, ao mesmo tempo, traz a esperança de que todos esses prédios poderiam ser muito bem reconstruídos, como ocorreu com cidades inteiras na Europa do pós-guerra, do México, e dos Estados Unidos, onde vivenciou boa parte de sua vida, em Washington, onde nasceu, e pôde perceber a importância da memória histórica, a partir da proximidade com museus na cidade americana.

A sua formação é em desenho industrial, mas o interesse em museus vem de muito cedo. Logo que chegou ao Cariri, o que mais chamou a sua atenção foram as platibandas. As partes superiores das fachadas ficavam muito evidenciadas, mesmo nas casas de taipa ou chalés. "As pessoas construíam pela beleza e para mostrar que tinham mais status. São muito geométricas, art déco, e, por mais humilde que a casa fosse, sempre tinha uma tentativa de inserir a geometria", explica.

Preservação
Seabra acredita que tenha identificado mais de mil casas com estas referências e cerca de 400 estão nas mãos de poucas famílias no Centro.

A sua vontade seria convencer as pessoas a continuar preservando esses traços, que passou a chamar de art déco do Cariri, pelo diferencial, e até menciona quem chame de sertanejo.

Rick Seabra ressalta que essa beleza ainda existente não foi erigida por arquitetos, e sim pelos pedreiros que recebiam 'carta branca' dos proprietários para criar. Para ele, eram mestres pedreiros e é muito raro ter o nome de alguém, mas ele identifica semelhanças nos trabalhos.

Apenas um deles, Salustiano Rego, de Teixeira, na Paraíba, foi lembrado por uma dessas proprietárias. "Ele fazia tudo na mão e com colher de pedreiro. Uma casa incrível, com esquadrias, piso, arcos e fachada", diz.

Sumiço
Rick Seabra chegou a identificar seis estilos em Crato, que vêm sumindo com as novas construções. "A cerâmica é o grande mal. Pode até ser colocada, mas seria interessante manter a platibanda. Não precisa, mas, por alguma razão, as pessoas não têm preservado, não sei a razão", diz.

O prejuízo é diretamente associado à memória histórica do lugar, conforme o diretor do museu. "As pessoas não estão tendo muito a consciência disso, e dizem que a coisa velha", afirma.

Alheamento
O Crato, segundo ele, lembra um pouco do que viu no Rio de Janeiro, e as pessoas querem que acabe. São reações que chamam a sua atenção e busca saber porque as pessoas estão alheias a esse passado.

O poder público, diz ele, deve trabalhar mais essa questão, no sentido de educar. "Tem que ser chato. As cidades europeias não são belas porque o europeu é insistente, além do poder público. Tem um trabalho em torno disso, pela preservação", explica. Mas o diretor destaca a necessidade de um trabalho até chegar nesse ponto, que deve ser feito em consonância com o poder público.

Espontaneidade
Seabra faz um trabalho corpo a corpo e até conseguiu que os proprietários mudassem de opinião e optassem pela platibanda. Também conta com atuação voluntária na recuperação das fachadas em 3D, com estudante da Universidade Federal do Cariri (UFCA), da área de design. A luta é para evitar o processo de "embanheiramento" das cidades, ao que se refere uma arquiteta de Brasília, com as fachadas apenas utilizando cerâmicas.

"Já cheguei a ver cerâmica antiderrapante preta na fachada", lembra. Juazeiro tem sido a cidade mais emblemática com a presença de casas com apenas cerâmicas nas fachadas. O movimento muito veloz de destruição não pode esperar, mesmo com um trabalho educativo nas escolas. "Até os 18 anos dessa garotada, não haverá mais nada. É essa a velocidade", completa.

Mais informações
Museu Histórico do Crato
Rua Senador Pompeu, 502
Centro
Telefone: (88) 5323-5491

ELIZÂNGELA SANTOS
REPÓRTER

Fonte: Diário do Nordeste

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