Juazeiro do Norte (CE): Cegos fazem curso de fotografia

O olhar da imaginação, da sensibilidade, o TransOlhar, fez com que deficientes visuais vivenciassem o desafio de participar de um curso de fotografia, na região do Cariri cearense. As atividades foram coordenadas pela fotógrafa e professora Nívia Uchoa. Desde muito tempo ela desejava encarar esse novo momento em seu trabalho, o que também acabou mudando a sua própria forma de ver a fotografia.

O desejo era antigo também para a maioria dos 11 alunos que decidiram participar do curso, promovido por iniciativa de Nívia, com o apoio da Universidade Federal do Cariri (UFCA) e Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB). Dos integrantes, cinco eram totalmente cegos e os outros com baixa visão.

As aulas foram realizadas em locais pré-estabelecidos, no intuito de promover algo que possibilitasse um espaço favorável para os alunos, a exemplo do Centro de Cultura Popular Mestre Noza, a Chapada do Araripe, Lira Nordestina, além do Centro de Acessibilidade da UFCA e a Organização não Governamental Juriti, em Juazeiro do Norte.

Desdobramento
O próprio nome do curso nasceu ao longo do seu percurso: TransOlhar. Para Nívia, um novo olhar nasce a partir do momento em que se pega numa máquina. Ela afirma que as atividades serão continuadas e a iniciativa ainda vai ter desdobramentos, a exemplo de uma exposição do material produzido durante a semana de atividades.

A aluna deficiente visual Jackeline Rolim participou de um curso ministrado pela fotógrafa em 2008 e isso a despertou para a possibilidade de que seria possível a realização de outros trabalhos do gênero. Ela já tinha câmera e queria aprender mais. A ex-aluna dedica sua vida à fotografia atualmente, mesmo não atuando de forma profissional.

Para Nívia Uchoa, esse trabalho tem uma importância social na promoção da acessibilidade, e viu nele a importância de haver uma dedicação maior a essas pessoas, que tinham a vontade de fotografar. "Tem gente que fica com piadinha mesmo, achando que as pessoas não tinham esse potencial. Mas eles já estavam com essa vontade. Descobri de alguns deles, ao longo das aulas", afirma.

Para ela, o trabalho foi fundamental, no sentido de fazê-la enxergar o mundo pelo olhar dos alunos. "Até pela própria ingenuidade do ser humano, de ver pelo olhar fotográfico, de encarar essa forma de comunicar", diz. Nívia destaca a câmera como uma substituição do nosso olhar. Segundo a fotógrafa, a forma de vivenciar essa realidade, pelos alunos, amplia muito mais a maneira de ver o mundo.

Empregar uma metodologia de trabalho para aplicar um pouco da técnica veio mesmo por meio da sensibilidade da fotógrafa. Ela destaca que utilizou a sinergia, o toque e, para facilitar a forma de captar as imagens pelos alunos, empregou uma bola japonesa nas atividades. "Quando eles queriam fotografar alguém, batiam a bola ou falavam e sentiam mais ou menos a distância das pessoas", explica. Os focos eram ajustados pela ministrante do curso, com os alunos.

A ideia dos espaços visitados foi justamente para eles sentirem os objetos a serem fotografados, como as xilogravuras e as esculturas. O trabalho foi realizado de forma lúdica, com técnicas no intuito de promover a acessibilidade. A intenção foi tornar acessível e poder compartilhar e dar oportunidade para essas pessoas de que é possível fazerem fotografia. O cachê do curso também será direcionado ao Centro Educativo de Apoio à Pessoas com Deficiência Visual do Cariri.

Será realizada uma reunião com os participantes para avaliar os trabalhos e depois haverá o planejamento para a exposição fotográfica, seja em material impresso, alto relevo ou baixo. O importante, neste momento, é dar visibilidade a esse resultado de um trabalho inédito, que poucos tiveram a oportunidade de vivenciar no Brasil.

Grande alegria
Para o aluno Antônio Rosa da Silva Júnior, poder participar de um curso como esse foi uma grande alegria. "Tive a oportunidade de pegar numa câmera, mesmo não existindo ainda equipamentos adaptados", afirma. Ele faz questão de enfatizar a sua visão de fotografar. "Temos um olhar que tem um significado próprio", diz. E essa forma de ver é definida pela aluna Rosiana Borges Simião como o "olhar da imaginação". Para ela, essa oportunidade foi uma forma de mostrar para as pessoas que os alunos são capazes. "A gente se sente realizado", afirma. Ela tem baixa visão e chegou a utilizar a máquina profissional da professora para fazer os seus cliques. "Foi uma grande oportunidade. Aproveitei para fazer muitas fotografias", conta.

Mais informações
Poesia da Luz
Rua Mocinha Dias, 112
Bairro Salgadinho
Juazeiro do Norte
Telefone: (88) 9 8855-2267

ELIZÂNGELA SANTOS
REPÓRTER

Fonte: Diário do Nordeste

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