Por que Heraldo nunca foi ofendido e Maju acabou discriminada?

Repórter especial em Brasília, Heraldo Pereira ocupa a bancada do Jornal Nacional na cobertura de folgas e férias do titulares desde 2002. Foi o primeiro jornalista negro na função desde a estreia do telejornal, em 1969.

Ser âncora do JN proporciona uma visibilidade muito maior do que ser ‘moça do tempo’. Então por que Heraldo, em 13 anos, nunca sofreu a mesma ofensiva racista direcionada a Maria Júlia Coutinho, que está na equipe do telejornal há apenas dois meses? Aliás, não foi a primeira vez que a jornalista tornou-se vítima de cyberbullying.

Apresento quatro conclusões pessoais e meramente especulativas:

Sexismo e misoginia 
Homem pode chegar no topo da profissão. Mulher? Não, mulher não pode. É inegável que o racismo em relação a Maju está impregnado também de machismo. Na sociedade brasileira do século 21, o sexo feminino ainda é visto por muitos como inferior, menos capacitado, com menor mérito. Maria Júlia ‘ousa’ falar de igual para igual com seu chefe, William Bonner. Já chegou até a corrigi-lo no ar. Essa independência e a força feminina incomodam, ainda mais quando associadas à cor da pele. Estudiosos afirmam que, no Brasil, a mulher negra sofre ainda mais preconceito do que o homem negro.

Negritude explícita
Maria Júlia assume quem é. Usa cabelo black power e dispensa maquiagem que clareia a pele. Ela não tenta disfarçar (inutilmente) sua origem étnica, como muitos o fazem ao chegar à TV. Em mais de uma ocasião, a apresentadora Regina Casé disse que, se a mulher é negra, mas tem o cabelo naturalmente liso ou alisado, é vista e tratada como branca, ou quase isso. Mas se é negra e tem o cabelo ‘pixaim’ (termo usado por ela), aí passa a ter um grande problema para ser aceita. O preconceito estético relatado por Casé tem lógica. Obviamente toda mulher tem o direito de usar o cabelo do jeito que quiser. Maju prefere os cachos crespos que evidenciam sua negritude. Não tenta disfarçar para, talvez, ser melhor aceita.

Alto custo da popularidade
Todo mundo já ouviu falar do tal preço da fama. Não é balela. Cobra-se realmente um pedágio de quem conquista o sucesso. Estar no horário nobre da TV é tornar-se a vidraça para pedradas. O JN já teve dezenas de ‘moças do tempo’. Porém nenhuma conseguiu o mesmo destaque de Maju. O carisma a transformou, num período de poucos dias, em queridinha da Globo e do público. Esse status incomoda quem não tolera a ascensão alheia. Heraldo Pereira sempre teve uma performance discreta no Jornal Nacional. Restringe-se aos textos gerados no teleprompter. Já Maju é a expansividade em pessoa. Improvisa, ironiza, ri, domina a cena. Virou celebridade, tem fãs. Isso é ultrajante para quem se incomoda com a presença de mulheres e/ou negros numa posição de destaque.

Puro recalque
A melhor resposta para os ataques racistas partiu da própria Maria Júlia Coutinho. Numa rede social, ela mandou ‘beijinho no ombro’ a quem a ofendeu. Cito aqui uma frase do midiático pintor espanhol Salvador Dalí (1904-1989): “O termômetro do sucesso é a inveja dos descontentes”.

Por: Jeff Benício

Fonte: Terra

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