Aves migratórias enfrentam diversas ameaças no CE

As alterações registradas nos últimos três anos no calendário de chuvas no Estado podem estar ocasionando modificações no processo migratório de aves que comumente são observadas em algumas regiões do Ceará neste período do ano. Entre as espécies que ainda não obtiveram registro de aparecimento em bando, até o momento, ou que foram vistas em pequenos grupos, estão as andorinhas e as avoantes. Ambas as espécies são vistas por especialistas como fundamentais no processo de equilíbrio ambiental, tendo em vista os serviços que prestam no sentido de impedir, principalmente, a proliferação de pragas e insetos.

Estiagem
Diferentemente das mudanças de locais para descanso e procriação, que acontecem, na maioria dos casos, quando há falta de alimento pela estiagem em áreas que já vinham sendo ocupadas por grupos ou bando de aves, em períodos anuais específicos, a migração é um fenômeno regular, caracterizada pelo deslocamento cíclico das espécies, onde, após registros de chuvas ou de períodos de seca, grupos de animais se dirigem para determinadas regiões ou locais em busca de condições satisfatórias para sobrevivência.

Devido às questões climáticas e ambientais nas diferentes regiões que compõem o Ceará, é possível observar grupos distintos de aves migratórias em áreas variadas do Estado. No entanto, desde o ano passado, há registros realizados por biólogos, observadores de pássaros e ornitólogos, apontando para o desaparecimento de algumas espécies nas regiões por onde passavam no período de migração ou, então, a diminuição considerável no número de indivíduos que formam os bandos destes animais. Um exemplo dessa situação é a redução no número de bandos de andorinhas azuis vistos no Ceará. A espécie é proveniente da América do Norte e utiliza regiões do País como área de descanso durante a viagem que realiza em busca da Argentina, dentre elas o Ceará.

No Cariri, o último registro da presença desta espécie de ave aconteceu no mês de abril deste ano. "Não havia notícias do surgimento de bandos de andorinhas azuis no Ceará desde o ano de 2013. Aqui no Cariri, inclusive, as andorinhas de outras espécies também não chegaram, ainda. O único registro que a região possui é em torno de um grupo de andorinhas de bando observado em fevereiro deste ano", observou o biólogo Jefferson Bob, especialista na observação de pássaros.

Segundo ele, era comum a presença de considerável número de bandos de andorinhas na região neste período do ano. No último triênio, no entanto, houve o desaparecimento da espécie na região. "A presença das andorinhas foram diminuindo consideravelmente, ano após ano, até chegar nesse momento, onde não há registro abundante dessa espécie nos municípios do Cariri", explicou.

Redução
O biólogo aponta, ainda, para um retardo no aparecimento de bandos de avoantes, cujo número também vem sendo reduzido nos últimos anos. "A permanência das avoantes no ano passado aqui no Cariri foi bem maior que em anos anteriores. Até o fim de junho de 2014 havia muitos indivíduos da espécie sobrevoando a região. Estas aves predominam, na fase migratória, nas áreas mais próximas à Chapada do Araripe. Porém, até o momento, não há registro de movimentação da espécie na região", frisou.

O ornitólogo Webber Girão, criador do projeto Soldadinho-do-Araripe, explicou, no entanto, que há diferenças importantes em relação ao processo migratório de cada espécie que precisam ser melhor observadas. Conforme ele, embora as condições climáticas desfavoráveis possam ser prejudiciais à manutenção das espécies em áreas que vinham sendo utilizadas por elas na fase migratória, diversos outros fatores também poderiam contribuir.

"As avoantes, por exemplo, têm um ciclo de migração que modifica o destino. Pode acontecer dessa espécie de ave não ser vista em determinada região, por conta da estiagem, ou de qualquer outro fator, pelo fato de ela ter se deslocado para outra local. O ciclo migratório, no entanto, não deixou de ser realizado. A diferença é que o destino sofreu uma mudança ocasionada pelo clima ou outra intempérie. Às vezes, há afirmações de que as migrações não estão acontecendo porque não se sabe, na verdade, para qual destino as aves estão se deslocando", observou o pesquisador.

Combate às pragas
Webber destacou a importância de ambas as espécies para o equilíbrio ambiental: "No caso das andorinhas, em geral, elas são todas insetívoras, ou seja, se alimentam de insetos que normalmente desequilibram o meio ambiente por meio, principalmente, das monoculturas que nós adotamos. Se não houvesse a chegada das andorinhas, algumas espécies de insetos iriam proliferar, como as saúvas, por exemplo.

Já no caso das avoantes, existe um componente histórico. O Ceará atravessou secas terríveis e, inclusive, o momento da chegada das avoantes muitas vezes coincidiu com o fim da estação seca. Em momentos de secas graves a chegada das avoantes era considerada como um mandado de deus. Boa parte dos cearenses devem a vida dos seus ancestrais ao socorro d essa ave".

Ameaças
Entretanto, ele observou que o comércio ilegal da ave para alimentação humana tem ocasionado prejuízos incalculáveis à espécie. "Infelizmente o comércio que existe hoje ignora que não há mais necessidade do consumo dessa ave. As pessoas insistem em degustar a ave com cachaça porque aprenderam que era bom, sem saber que essa ação está prejudicando em demasia a espécie", ressaltou.

O ornitólogo demonstrou, ainda, preocupação em relação ao uso de agrotóxicos em lavouras, responsáveis, segundo ele, por considerável redução no número de andorinhas. "No momento em que a gente usa o veneno de maneira indiscriminada, como normalmente acontece no Brasil, sobretudo aqui no Nordeste, esse veneno se acumula nos insetos que as aves consomem. O diazinon, por exemplo, utilizado na floricultura, para combate à formiga, é especialmente nocivo para aves", explicou.

ROBERTO CRISPIM
COLABORADOR

Fonte: Diário do Nordeste

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