Juazeiro do Norte (CE): Salário dos professores afeta educação

Após mais de dois meses de paralisação, a greve dos professores efetivos deste município expõe distorções entre a realidade vivenciada na maioria das unidades públicas de ensino de Juazeiro do Norte e o clima de descontentamento entre o professorado e a gestão municipal. Se por um lado há o clamor dos docentes por reconhecimento, melhoria salarial e maior oferta de cursos de capacitação, por outro, mesmo que com algumas falhas, o sistema consegue manter o atendimento no que se refere à distribuição da merenda escolar nas unidades de ensino, transporte de alunos e certa qualidade na infraestrutura física dos equipamentos educacionais.

Durante a manhã de ontem, a reportagem do Diário do Nordeste percorreu estabelecimentos educacionais da rede pública do Município para conhecer de perto a realidade vivenciada por quem, cotidianamente, participa do processo de transmissão de aprendizado neste município. Nestas unidades, com raras exceções, o maior problema relatado pelos docentes, membros do corpo pedagógico e diretores das unidades está na forma de relacionamento que o município mantém com os profissionais e a falta de um canal de diálogo entre a categoria e o Município.

Na Escola Municipal de Ensino Fundamental Izabel da Luz, localizada no bairro Pirajá, por exemplo, embora o prédio seja antigo e necessite de algumas modificações em sua estrutura física, como pequenos reparos e pintura, não há deficiência em relação ao transporte dos alunos, tampouco falta merenda para ser servida diariamente. Todas as salas são bem iluminadas e contam com ventiladores de teto para refrescar os ambientes. A biblioteca é repleta de livros e a sala de multi-meios funciona sem dificuldades.

Durante a greve dos professores efetivos, as aulas foram mantidas por meio de sistema de rodízio. Na unidade, funcionam turmas de 1º ao 5º ano do ensino fundamental, distribuídas nos turnos da manhã e tarde. Todos os alunos, num total de 502, tiveram, pelo menos, três dias de aulas por semana. As aulas foram ministradas por professores contratados em regime temporário ou por docentes que não aderiram ao movimento paredista.

Compromisso
"A luta que está sendo travada é justa. Os professores têm direitos que precisam ser respeitados. O Município precisa compreender que há uma necessidade muito grande no que se refere à ampliação de investimentos para o setor da educação. Esse investimento que o professorado busca, sobretudo, deve ser destinado para ampliação do conhecimento dos docentes. Os professores devem receber maior número de capacitações. Infelizmente, o município não inova, não cria novas alternativas. Não investe no potencial do professor. Isso acaba refletindo na qualidade do aprendizado dos nossos alunos", avalia a professora Expedita Silva, que desistiu de participar do movimento paredista para que seus alunos não fossem prejudicados.

"Eles (os alunos) têm direito a 200 dias letivos. Os prejuízos já são inúmeros. Voltei porque compreendo que o aluno não pode mais continuar prejudicado. A Prefeitura, no entanto, precisa compreender as reivindicações e abrir um canal de conversação o mais rápido possível. Ninguém quer a continuação da greve. O que se espera é que haja a criação de uma política que atenda às demandas que a categoria possui", diz a docente.

A diretora da unidade, Maria Amaro, observou que, embora existam unidades onde as carências sejam maiores, na maioria das escolas da rede pública do município a questão que ainda emperra o crescimento educacional de Juazeiro do Norte é mesmo a falta de reconhecimento por parte da Prefeitura. "Aqui, pelo menos, não há problema relacionado a questões de merenda, transporte de alunos ou questões pertinentes à estrutura física. Claro que, vez por outra, acontece algo que precisa de um cuidado maior. No entanto, a reclamação do professorado é mesmo relativa à necessidade de mudanças no atual sistema. Os professores querem ser mais valorizados", explicou.

Na Escola de Educação Infantil e Fundamental Tarcila Cruz Alencar, que atende a 886 alunos residentes no bairro Betolândia, a situação também é de descontentamento com o atual sistema educacional desenvolvido no Município. A unidade, mantida limpa e bem preservada, não apresenta problemas de falta de livros didáticos, merenda escolar, falta de luzes em salas de aula, tampouco houve interrupção de aulas, a não ser no 8º e no 9º do ensino fundamental. "Nestas duas séries não houve como manter as aulas porque a maioria dos professores decidiu aderir a paralisação. Porém, nas demais séries, as aulas foram mantidas graças ao esforço e à dedicação do nosso quadro", comentou a diretora da escola, Graça Pinheiro.

Segundo ela, a educação no município tem funcionado por causa do interesse dos profissionais do setor. A diretora não descarta, porém, ações desenvolvidas pela administração local como forma de buscar auxiliar a categoria. "Não é possível culpar, apenas, o prefeito. É preciso dividir essa responsabilidade com alguns gestores da educação que não tiveram compromisso, principalmente, com os nossos professores. A gente compreende que o prefeito Raimundo Macedo possui interesse em auxiliar. No entanto, é necessário que haja uma grande mudança no próprio sistema. As falhas existem e precisam ser sanadas. A adoção de maior incentivo aos professores seria um bom início para que as situações existentes sejam dirimidas", observou.

Merenda
Já na Creche Odete Mattos, onde estão matriculadas 200 crianças, as aulas também foram mantidas por causa da dedicação dos profissionais que atuam no equipamento. A unidade já recebeu todos os livros didáticos e tanto a dispensa quanto as geladeiras estão cheias com produtos da merenda escolar. "Pode até faltar alguma coisa, mas, quando acontece, no outro dia a Secretaria encaminha. Não temos dificuldades com problemas físicos em sala de aula. Há uma porta de um banheiro que precisa ser consertada e é só. Mas, sempre é bom contar com maior quantidade de recursos. Melhor sobrar do que faltar", avalia a diretora Veridiana Mendes.

Jovem educadora, ela também aponta para a necessidade de mudanças no sistema educacional de Juazeiro do Norte, a partir de uma melhor valorização dos profissionais e de investimentos financeiros nas unidades. "Particularmente, eu acredito que o município poderia fazer mais. O investimento ainda é diminuto. Embora não perceba nenhum caos no setor, as escolas precisam de recursos para que possam ser mantidas com eficiência e, creio, o município necessita criar uma nova política de valorização do professorado", concluiu.

A reportagem tentou, várias vezes, na manhã de ontem, ouvir o secretário de Educação de Juazeiro do Norte, Geraldo Alves. O secretário, no entanto, não foi localizado e as ligações feitas para o número celular dele também não foram atendidas. Também foram feitas ligações para o celular do prefeito. O aparelho, no entanto, estava desligado ou fora da área de cobertura.

Não cumprimento do piso resultou na crise
A greve dos professores de Juazeiro do Norte foi iniciada no último dia 23 de fevereiro, após a Câmara de Vereadores aprovar matéria encaminhada pelo Executivo concedendo reajuste na ordem de 6,5% nos vencimentos dos salários de todas as categorias dos servidores municipais. A matéria foi aprovada no dia 3 de fevereiro, ocasião em que a categoria reivindicava que fossem aplicados os percentuais de 13,01% anunciados em janeiro pelo Ministério da Educação, referentes ao Piso Nacional do Magistério, que ampliou de R$ 1.697,00 para R$ 1.917,78 a referência mínima para o vencimento das carreiras de professores com formação de nível médio.

Na ocasião, a presidente do Conselho do Fundeb no Município, professora Maria Rodrigues Pontes Alexandre, chegou a afirmar que o sentimento de revolta predominava junto ao professorado municipal. "Nós repudiamos com veemência a aprovação desse reajuste que o Município quer empurrar goela abaixo do professorado. Existe um Plano de Cargos e Carreira que precisa ser cumprido. O professor precisa receber pela sua titulação. O que a Prefeitura está fazendo com a categoria chega a ser desumano. Estão desrespeitando uma Lei federal e condicionando prejuízos aos servidores", disse à época da votação do reajuste salarial a professora Maria Rodrigues.

Por conta da situação, alegando "improbidade administrativa, em virtude de praticar ato contrariando dispositivo previsto em Lei federal e, desta forma, lesando a Constituição, ao violar o princípio da legalidade", o afastamento do prefeito de Juazeiro do Norte, Raimundo Antônio de Macedo, o Raimundão, foi solicitado à Justiça pelo MPCE.

Na última quinta-feira (23), o gestor enviou à Câmara de Vereadores novo projeto ampliando em mais 6,5% o salário dos professores, atingindo, desta forma, os 13,01% reivindicados pela categoria. Até o fechamento desta matéria, o projeto ainda tramitava no Legislativo de Juazeiro do Norte.

Mais informações
Secretaria de Educação de Juazeiro do Norte
Rua 15 de Novembro, S/N
Bairro São Miguel 
Telefone: (88) 3511 5407 / 3511 5382

ROBERTO CRISPIM
COLABORADOR

Fonte: Diário do Nordeste

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