Lei Seca: 15 multas são aplicadas por dia no CE

A realidade é conhecida e os fatos comprovam que a combinação álcool e direção tem resultados letais. A legislação proíbe a mistura e, nos últimos anos, medidas mais rígidas foram adotadas para tentar coibir a prática perigosa. Ainda assim, passados mais de seis anos de vigor da chamada “Lei Seca”, há resistência e conduzir veículos sob efeito do álcool, no Ceará, continua sendo uma ação corriqueira.

No Estado, em 2014, até novembro, a cada 24h, em média, 15 multas foram aplicadas por desrespeito à Lei Seca. A mesma média é verificada se contabilizadas todas as autuações no Ceará, entre junho de 2008 (quando a Lei Federal 11.705 entrou em vigor) e novembro de 2014.

Com as novas regras, passou a ser considerado infrator todo motorista que ao fazer o teste do bafômetro apresentasse nível alcoólico acima de 0,1 miligrama por litro (mg/L) de ar expelido do pulmão ou 2 decigramas (dg) de álcool por litro de sangue.

A Lei determinou que o condutor transgressor estava sujeito a pena administrativa de multa (R$ 957,70), a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) por 12 meses e criminalmente ser condenado a detenção de seis meses a três anos. Neste período, a embriaguez era comprovada somente pela realização de testes de alcoolemia, exames clínicos ou perícia.

A medida trouxe algumas mudanças e, em 2009 (primeiro ano completo de vigor da lei), o Ceará registrou 11.244 autuações - a maior quantidade na série histórica de validade da legislação.

Porém, ainda assim, nacionalmente verificou-se a necessidade de readequar o texto, tornando a norma mais rigorosa. O resultado disso foi a Lei 12.760, de 2012, que proíbe o consumo de álcool por condutores.

A alteração fixou em 0,05mg/l de ar expelido do pulmão a quantidade aceitável de álcool para condutores, além de admitir a utilização de vários meios (como vídeos, fotos e testemunhas) como prova para incriminar o condutor, além da declaração do agente de polícia. Em casos de reincidência em prazo de 12 meses, a multa (R$ 1.915,40) passou a ser dobrada, e o valor chega a R$ 3.830,80.

A pena mínima foi ampliada para um a quatro anos se a ação provocada pelo condutor embriagado resultar em lesão corporal, três a oito anos, se a lesão corporal for grave e de quatro a 12 anos, caso resulte em morte.

No decorrer desses anos, no Ceará, foram aplicadas 36.318 multas a motoristas que insistem em dirigir após ingerirem álcool, segundo o Departamento Estadual de Trânsito (Detran). Do total, 60% das autuações foram registradas no período de menor rigor na regra, entre 2008 e 2011. Dados do Detran também apontam que entre 2008 e 2013, 10.503 pessoas morreram no Estado vítimas de acidentes de trânsito.

Óbitos
Os anos em que a lei vigorou de forma mais branda (2008- 2011) acumularam 60,4% das mortes, com 6.352 óbitos contabilizados. E é justamente esta uma das justificativas para o estabelecimento da tolerância zero a partir de 2012: reduzir com mais eficácia a quantidade de óbitos.

No maior hospital de traumatologia do Ceará, o Instituto Doutor José Frota (IJF), em 2013, entre maio e dezembro, foram atendidas 16.550 vítimas de acidentes de trânsito. Do total, 9.102 usavam moto, 2.835 carro, 1.136 bicicleta, 184 caminhonete, 86 caminhão e 3.207 eram pedestres. Dados de 2014 não foram divulgados pelo hospital, que informou que um balanço sobre o impacto da Lei Seca na redução dos atendimentos será feito futuramente.

Atualmente, segundo o Detran, o órgão possui 80 bafôme-tros para a realização de fiscalização ordinária e a Polícia Rodoviária Estadual tem outros 80 equipamentos. Mas, a resistência dos condutores ainda é grande. A prova disso é que dos 5.075 casos de desrespeito à Lei Seca registrados em 2014 no Ceará, de acordo com o órgão, somente em cerca de 15% os condutores fizeram o teste do bafômetro.

Bafômetro
Conforme o Detran, “isso acontece porque a maioria prefere não sobrar o bafômetro com medo de indicar o índice de álcool no sangue. Mas, o artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro determina que a simples recusa de fazer o teste é um indício de que o condutor ingeriu bebida alcoólica”. Nestes casos são abertos processos administrativos, e a multa é a aplicada. A suspensão da CNH por um ano só acontece após o final do processo administrativo, que demora entre seis e 12 meses.

De 2008 até novembro de 2014, cerca de 1.200 motoristas foram apreendidos, mas todos foram liberados mediante pagamento de fiança. Neste caso, de acordo com o Detran, todos respondem a dois processos: o administrativo e o criminal.

Em 2013, o número de prisões por estarem com índice de álcool no sangue acima de 0,34mg por cada litro expelido pelos pulmões chegou a 575. Até novembro do ano passado, foram 446 detenções. Ao longo destes seis anos de vigor da Lei Seca, mais de 10 mil pessoas tiveram o processo administrativo concluído, resultando a suspensão da CNH por 12 meses.

“Não podemos dizer que falta legislação. Temos uma das leis mais modernas do mundo e também mais severa”, garante o presidente da Comissão Especial de Assunto de Estudos sobre o Direito do Trânsito e Tráfego da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) secção Ceará, Fernando Alfredo Franco.

Para Fernando, a norma que tem características tão rígidas, no primeiro momento, não teve efeitos compatíveis com a rigidez e poderia ter sido mais exitosa. “Não basta pensarmos somente a aplicabilidade da lei. É necessário que o poder público trabalhe a conscientização”. Ainda assim, ele considera que a lei trouxe impactos positivos.

O presidente da Comissão analisa ainda que para que alterações possam ser feitas e outras medidas de combate a embriaguez adotadas, é necessário que os órgãos gestores de trânsito invistam na elaboração de estatísticas que possam subsidiar mudanças na legislação. “Temos avaliar qual o índice de álcool no sangue dos condutores que se envolvem em acidentes. Isto tem que ser medido para termos um parâmetro. Temos que ter pesquisas, levantamentos, dados que possam subsidiar”, diz.

Fiscalizações
O Diário do Nordeste contactou o oficial de Comunicação da PRE, capitão Edvaldo Ferreira, e solicitou informações sobre as fiscalizações ordinárias da Lei Seca, porém, até o fechamento desta edição não obteve retorno.

Embora a fiscalização do consumo de álcool seja competência dos órgãos executivos estaduais e rodoviários, a Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e de Cidadania (AMC) afirma atuar na fiscalização da alcoolemia através de convênio, executando ações em parceira com o Detran e a PRE.

Nas ocorrências atendidas pela AMC, caso haja suspeita de embriaguez, o condutor é submetido ao teste de alcoolemia ou outros meios de constatação definidos em lei, como, por exemplo, um termo de constatação preenchido pelo agente. O órgão informa que não existe uma área da cidade priorizada, já que o efetivo atende a toda a Capital, em conjunto com as autoridades de trânsito do Estado. Sobre o número de infrações, a AMC diz que ainda está sendo levantado.

No âmbito educativo, o órgão desenvolve o projeto “AMC nos Bares”, que realiza abordagens em restaurantes e bares de Fortaleza com o propósito de orientar os motoristas sobre a Lei Seca e do perigo de misturar álcool e direção.

BRs contabilizam 98 mil testes 
Nas BRs que cortam o Ceará, entre 2011 e novembro deste ano, foram feitos 98.723 testes de alcoolemia, conforme dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Em nota, a instituição informou que “não resta dúvidas quanto à importância do endurecimento da Lei Seca para a sociedade brasileira, visto que milhares de pessoas têm sido poupadas da violência no trânsito”.

Nesse intervalo de tempo, 2.409 condutores foram autuados e 746 foram presos por dirigirem alcoolizados nas rodovias. Conforme a PRF, ao fazer a análise dos dados de 2013, quando teve início a fiscalização amparada pelo rigor da nova legislação, houve um aumento de 102% no número de testes realizados (passando de 19.025 para 38.598), mas o número de autuações não seguiu a mesma tendência de aumento e ficou em 39% se comparados aos dados de 2012.

Já entre janeiro e novembro do ano passado, a PRF registrou 38.194 testes de alcoolemia, 796 autuações e 157 prisões. Em 2013 (período de janeiro a novembro), foram registrados 34.945 testes de alcoolemia, 791 autuações e 314 prisões.

“Comparando esses períodos, percebemos o quanto a legislação favoreceu a sociedade, pois mesmo com um aumento de quase 10% no número de testes realizados em 2014, verificamos uma redução de 50% no número de prisões por consumo de álcool”, analisa em nota a PRF.

A Polícia Rodoviária garante ainda que a redução de 50% nas prisões de condutores enquadrados em crime de trânsito confirma uma maior conscientização da população.

THATIANY NASCIMENTO
REPÓRTER

Fonte: Diário do Nordeste



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