Conheça melhor a sacarina: da sua descoberta às alegações de câncer

A sacarina foi o primeiro adoçante artificial descoberto pelo homem, inventada por Constantin Fahlberg em 1878. Hoje em dia podemos encontrar a substância em centenas de produtos do nosso dia a dia, de refrigerantes diets a bolos e sorvetes normais que buscam reduzir a quantidade de calorias empregadas em sua preparação. Ela foi o primeiro composto a oferecer uma alternativa barata ao açúcar e por isso é utilizada de maneira tão ampla.

A sacarina funciona tão bem como dietético porque o corpo humano não é capaz de absorvê-la, eliminando-a na urina sem nenhum tipo de consumo de calorias. Apesar de algumas pessoas acreditarem no potencial cancerígeno de produtos dietéticos, este composto químico vem sendo usado pelos seres humanos há mais de 100 anos sem nenhuma prova consistente de que ele faça mal ao nosso organismo.

Uma descoberta inusitada
A história da descoberta da sacarina é particularmente interessante porque ela ocorreu por acidente. Tudo começou em um pequeno laboratório na John Hopkins University, em Maryland, Estados Unidos. O local era propriedade do professor de química da universidade, Ira Remsen, mas estava sendo empregado pelo russo Fahlberg para testar a pureza de determinados carregamentos de açúcar.

Depois de terminadas as funções principais do seu trabalho, Constantin Fahlberg passou muitos meses utilizando o laboratório para outros propósitos, como o desenvolvimento de derivados de piche de carvão. Em uma noite, depois de voltar para a casa, ele percebeu que o pão que ele comia estava extremamente doce. Depois de descartar a hipótese de ter sido um erro da padaria, ele chegou à conclusão de que a doçura deveria ser resultado de um composto químico que estava em suas mãos.

Certamente o razoável a se fazer em uma situação dessas, a ingestão de um composto desconhecido, é colocar a sua mão na goela e tentar vomitar tudo que você ingeriu, e em seguida chamar uma ambulância, pois você pode ter sido intoxicado. Fahlberg não foi tão razoável, e decidiu voltar ao laboratório desconfiando que ele havia feito uma nova descoberta. Vale notar que a sacarina só foi inventada porque um químico descuidado se esqueceu de lavar as mãos antes de jantar.

No dia seguinte, o cientista descobriu a origem da misteriosa substância química da maneira mais errada possível. Sem pensar em nenhuma outra alternativa, ele decidiu provar todos os compostos com que havia trabalhado na tarde anterior, mostrando mais uma vez sua dedicação pela Ciência e a falta completa de um sentido de autopreservação.

Um começo turbulento para a sacarina
Eventualmente, Fahlberg descobriu qual era o composto doce entre aqueles que ele havia produzido. Ele estava em um béquer no qual havia uma mistura de ácido sulfubenzoico, cloridio de fósforo e amônia. Fervendo estes componentes durante uma tarde, o resultado foi uma Imida o-sulfobenzóica, um composto que ele estava bem familiarizado, mas que nunca havia provado o gosto.

Depois da estranha descoberta, Fahlberg, ao lado de Remsen, o dono do laboratório, tratou de escrever e publicar a respeito do novo achado. O texto de 1879 trazia os dois como criadores do composto químico. Entretanto, sempre um passo atrás de si mesmo, Fahlberg percebeu as implicações comerciais do que tinha desenvolvido e, quando foi patentear a sacarina, decidiu deixar o seu companheiro de fora do texto final.

Os dois antigos parceiros logo se tornaram grandes rivais na briga pela autoria. Muitos dizem que Remsen foi fundamental para encontrar a sacarina, não apenas por se tratar de seu laboratório como também por ter publicado dezenas de estudos a respeito de ácidos sulfobenzoicos. Quando perguntado sobre a questão, ele respondeu: “Fahlberg é um canalha. Me deixa nauseado ouvir o meu nome sendo pronunciado na mesma expiração que ele”.

Apesar de ter sido usada como adoçante desde o final do século XIX, a sacarina só conseguiu se popularizar mesmo durante a Primeira Guerra Mundial. No período ocorreu uma baixa na produção do açúcar, especialmente do tipo derivado de beterrabas, que eram majoritariamente produzidas na Alemanha e na Áustria. Com a escassez do produto, que na Inglaterra durou até 1920, muitos comestíveis tiveram adição de sacarina para alcançar os níveis desejados de doçura, o que transformou o produto em um grande sucesso que continua até os dias de hoje.

Afinal, a sacarina pode causar câncer?
O mito de que a sacarina era um composto cancerígeno só foi efetivamente desbancado recentemente, em uma disputa que começou na década de 70 e durou até 2010. No início desse período, um estudo publicado chegou à conclusão de que diversas populações de ratos expostas à sacarina tinham tendência a desenvolver câncer de bexiga.

Este estudo inicial foi muito criticado desde que foi publicado pela primeira vez. Em 1974, a Academia Nacional de Ciência fez uma análise do texto e concluiu que até aquele momento era impossível concluir que a sacarina fazia algum mal e que a alegação de câncer era oriunda de pesquisas com falhas metodológicas e ambíguas.

Em 1977, um grupo de pesquisadores quase convenceu o governo americano a proibir a substância, que foi defendida em um evento batizado de “Saccharin Study and Labeling Act of 1977”. O resultado foi que a sacarina poderia continuar a ser comercializada desde que houvesse um pequeno aviso em todos os produtos que a utilizassem sobre o seu potencial cancerígeno.

O problema com a pesquisa original é que, apesar dos tumores nas bexigas dos ratos, estes animais ainda são muito diferentes dos seres humanos, e na década de 70 a sacarina já estava sendo consumida por quase 100 anos sem nenhuma consequência aparente. O problema eram as condições específicas da urina dos ratos, pois, quando combinadas com a sacarina, elas acabavam por formar microcristais dentro das bexigas dos pequenos roedores. Estes cristais feriam o interior das bexigas, que deveriam ser constantemente reparadas pelo corpo, gerando desta maneira células cancerígenas.

O mesmo estudo extensivo foi depois realizado com primatas, e todas as análises com as populações expostas a doses diárias de sacarina apontaram resultados perfeitamente saudáveis nos macacos. Desta maneira, no ano 2000, a sacarina foi removida da lista oficial de substâncias cancerígenas pelo Programa Nacional de Toxicologia dos Estados Unidos. O golpe derradeiro sobre esta dúvida chegou em 2010, quando a Agência de Proteção Ambiental publicou uma resolução definitiva afirmando que “a sacarina não pode mais ser considerada um produto que cause prejuízos ao corpo humano”.

Como os últimos estudos se mostraram definitivos, a substância goza hoje em dia do direito de ser comercializada sem qualquer tipo de aviso especial na maioria dos países do mundo, incluindo no Brasil.

Fonte: Mega Curioso (via Gizmodo)



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