78% dos abatedouros são ilegais no Interior do Estado

Dos cerca de 180 municípios do Ceará com matadouros públicos, somente 33 são licenciados pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace). Isto significa que 78% das cidades estão consumindo a chamada "carne de moita", ou seja, o abate não aconteceu conforme as exigências básicas da Vigilância Sanitária.

De acordo com a normas sanitárias, o abate do animal e o manuseio da carne devem ser feitos sem nenhum contato com o solo. No processo, o animal deve ser colocado em um box de atordoamento, onde será sacrificado utilizando uma pistola pneumática. Em seguida, o corpo do animal é guinchado pela perna, através de trilhos aéreos, onde é levado ao tanque de sangria. Todo o manuseio deve ser realizado a um metro do chão. Quem realiza o corte deve estar com todos os equipamentos de proteção, de modo a não ter contato direto com a carne, garantindo a qualidade do alimento.

Esses são alguns dos processos que não são realizados em mais da metade dos abatedouros. De acordo com a presidente da União Internacional Protetora dos Animais (Uipa), o retrato é bem diferente. Além das péssimas condições de higiene, onde os animais são muitas vezes cortados em mesas ou diretamente no chão, em contato direto com quem faz o trabalho, em meio a estruturas precárias e sujas, os maus tratos com os animais ainda é muito grande.

"Na maioria dos matadouros ainda acontece a morte por marretadas, onde o animal fica agonizando", denuncia. Em um dos casos vistoriados pela Uipa, no antigo Frifort, atualmente fechado, o sofrimento dos animais não era somente na hora do abate, eles viajam centenas de quilômetros de pé, sem água nem comida, apertados na carreta de um caminhão. Ao chegar, ficavam até quatro dias no pátio do matadouro, recebendo só água.

Diante disso, ela fez um projeto de lei e entregou ao então deputado João Alfredo, que apresentou à Assembleia Legislativa, onde foi aprovado e sancionado pelo Governo do Estado.

Legislação
A Lei 12.505, de 9 de novembro de 1995, obriga a todos os matadouros do Ceará a utilizar o método cientifico, com uso da pistola pneumática no abate de animais e proíbe a utilização de marreta, foice, machado, entre outros utensílios similares. Porém, segundo ela, há uma constante luta para que a legislação seja cumprida no Estado.

"Desde do ano de 1995 que luto para que adquiram a pistola, mas o abate é da forma antiga. Solicito Audiências Públicas, reuniões com autoridades etc, mas as pessoas não se conscientizam. Vivo recebendo denúncias de todo o Interior do Estado, alguns com vídeos e fotos. Tudo é encaminhado ao Ministério Público e a partir daí ou o local é interditado ou é assinado um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com a Prefeitura", conta Geuza.

Ela critica a falta de fiscalização das autoridades competentes e diz que a responsabilidade também é dos municípios que não fiscalizam e liberam alvarás de funcionamento para locais nessa situação.

Doenças
De acordo com o presidente do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV-CE), José Maria dos Santos Filho, o consumidor que se alimenta de carnes abatidas em locais que não seguem as normas da vigilância sanitária, pode adquirir aproximadamente 200 doenças que podem ser transmitidas dos alimentos ao homem, através da ingestão de toxinas, bactérias e vírus.

De acordo com ele, esses agentes infecto-contagiosos podem ser detectados em exames realizados nos animais vivos, após o abate, ou ainda, por meio de exames laboratoriais. "Para tanto, os matadouros, sejam de bovinos, suínos, caprinos/ovinos, aves; as empresas de laticínios, mel e pescados e qualquer outra que trabalhe com produtos de origem animal, devem possuir um sistema de inspeção sanitária desses produtos, de modo a garantir a inocuidade do alimento", afirmou.

Ainda de acordo com o presidente do CRMV, de um modo geral o matadouro ou empresa processadora de alimentos deve ser uma atividade preferencialmente comercial. Porém, na ausência dessas, os municípios cearenses, no intuito de impedir a venda desses produtos oriundos de "moitas", sem a devida inspeção de um médico veterinário, acabam por implantar matadouros públicos. "Em sua ampla maioria, não passa de umas moitas oficializadas já que não atendem aos mínimos requisitos tecnológicos e higiênicos necessários para garantir a sanidade dos produtos de origem animal, seja pelas deficientes condições estruturais, seja pela falta de equipamentos adequadas ao abate, seja pela falta dos inspetores de alimentos médicos veterinários, concursados, ou ainda pela falta de médico veterinário responsáveis técnicos pelo estabelecimento", criticou.

Segundo um relatório realizado pela CRMV, em 2013, dos 184 municípios cearenses 154 possuíam abatedouros públicos, destes, 128 possuíam registro no CRMV. Entre matadouros interditados ou desativados, o número era de 34.

Ainda segundo José Filho, o Conselho faz fiscalização rotineira dos matadouros denunciando ao MP quando detectadas irregularidades. "Ocorre que, quando o matadouro é fechado, normalmente o criador abate os animais em moitas e a Vigilância Sanitária não coíbe essa prática, o que seria bem fácil, já que normalmente todos sabem onde esses animais são abatidos. Se não souber, é só fazer uma fiscalização nas feiras municipais, e açougues, pedindo o documento que comprove a origem da carne".

Mais informações
CRMV - (85) 3272.4886

Uipa - (85) 3261.3330

ELLEN FREITAS
COLABORADORA

Fonte: Diário do Nordeste



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