O que há de novo em Francisco

A edição da revista Time que elegeu o papa Francisco como personalidade do ano é o coroamento de um 2013 que viu, em toda a plenitude, o perfil francamente midiático do argentino Jorge Bergoglio. Eleito há nove meses, o sumo pontífice conseguiu conquistar a imprensa secular com declarações e gestos que destoam do receituário pomposo de seu antecessor Bento XVI.

Dispensou a estola na primeira aparição em público, trocou o apartamento papal no Palácio Apostólico pela residência Santa Maria, prefere um Ford Focus no lugar da Mercedes. Usa branco simples, cruz de ferro, anel de prata.

O Twitter do papa é usado regularmente. No último dia 19, o sacerdote pediu a Deus a graça de ver um mundo onde “mais ninguém tenha que morrer de fome”.

Mandou mensagem aos seguidores inclusive no dia em que completava 77 anos, na última terça-feira, quando também rezou uma missa e tomou café-da-manhã com quatro moradores de rua.

Mas, ademais desses dados superficiais que compõem a figura do sacerdote, ele tem sido destacado por dois tipos de decisões difíceis de ser tomadas e que são, de alguma forma, enfrentadas por ele: uma delas administrativa; a outra religiosa.

A primeira se refere à reforma da Cúria Romana, que ele já chamou de a “lepra do papado”. O banco do Vaticano, cujo nome é Instituto para as Obras para a Religião (IOR), está imerso em denúncias de crimes fiscais, como lavagem de dinheiro. Pela primeira vez em 125 anos, números do IOR passaram a ser divulgados pelo Vaticano - R$ 259 milhões foi o lucro do banco em 2012.

Além disso, nomeou seu secretário pessoal, monsenhor Alfred Xuereb, para ficar de olho nas movimentações financeiras do banco e também da Santa Sé.

A outra ênfase de Francisco vai na direção do texto bíblico. O primeiro documento escrito por ele, a Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium” (A alegria do Evangelho) destaca a missão evangelizadora dos fiéis e uma igreja menos centralizada no papa. “Se for bem entendida, a diversidade cultural não ameaça a unidade da Igreja”.

Ele ainda reflete sobre a Igreja (“prefiro uma Igreja machucada, ferida e suja, porque foi às ruas”), sobre a desigualdade (“devemos dizer ‘não a uma economia da exclusão e da desigualdade social’”) e também sobre a idolatria do dinheiro (“A adoração do antigo bezerro de ouro encontrou uma nova e cruel versão no fetichismo do dinheiro”).

Os conservadores americanos colocaram-lhe a pecha de marxista, enquanto a revista Advocate, uma renomada publicação gay dos Estados Unidos, elegeu o papa como a personalidade do ano.

“Se a pessoa é gay, busca a Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?”, já afirmou o papa em entrevista. Disse ainda que, mesmo tendo direito de manifestar opinião, a Igreja não pode interferir espiritualmente na vida de gays e lésbicas.

Por outro lado, sua articulação contra o projeto que aprovou o casamento igualitário na Argentina, quando ainda era bispo de Buenos Aires, foi dura e altissonante.

O também jornalista argentino Horacio Verbitsky vai na contramão do coro dos contentes. Enquanto o papa cria comissão para combater casos de pedofilia, Verbitsky revelou que caso do sacerdote Julio César Grassi, que mesmo condenado a 15 anos por pedofilia teve o apoio irrestrito do agora papa.

Longe de ser unanimidade, o papa e o que ele propõe é, antes, matéria de reflexão. Por isso, que análise podemos fazer dessa Igreja - nova? - proposta por Francisco.

Fonte: O Povo



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