Mestre Noza: Entalhe do instinto

Em 21 de dezembro de 1983, falecia o artista Mestre Noza, xilógrafo de cordéis e santeiro de Padre Cícero 

Na hora da precisão, o homem de tudo inventa – assim Mestre Noza justificava sua incursão pela arte. Segundo ele, após meses trabalhando de peão na estrada de ferro de Juazeiro do Norte e com funilaria, teve certeza de que o que queria para a vida ser seu próprio patrão.

“Eu não queria ser empregado de ninguém, nem andar nas casa alheia. Toda vida eu não quis esperar por homem. Por que quem nasce pra esperar por homem é mulher e tem delas que ainda espera agoniada, não é?”, detalhou, entre risos, em entrevista a Geraldo Sarno, cineasta baiano.

Além do mais, roubara uma moça da casa dos pais e precisava sustentá-la. “Num dava para a despesa daquela mulher, não dava, a arte de funileiro não dava. Eu era muito vagaroso na arte. Fiquei apressado, que se eu continuasse naquela arte a mulher ia passar mal”, narrava, com humor.

Decidiu estudar uma nova arte, que não fosse com ferro e tivesse matéria-prima barata. Chegou à imburana, madeira macia, feito “gente sem bondade”. “Para onde se leva o canivete, ele vai bem, macio, sem levantar fibra”, dizia.

Na tradição dos gravadores de Juazeiro do Norte, no Cariri cearense, a figura de Noza é indispensável. Foi ele um dos primeiros ilustradores de capas de cordéis com xilo e, também, um dos pioneiros no entalhe da imagem de Padre Cícero, feita a partir do próprio “Padim”, ainda vivo àquela época.

Inocêncio Medeiros de Oliveira ou Inocêncio da Costa Nick, como ele se nomeava, nasceu em Pernambuco, mas arribou para o Juazeiro entre romeiros, por volta de 1912, aos 15 anos de idade. Datas e fatos não são muito precisos na história do imaginário. Contudo, seja como modo de sustento ou de expressão de uma arte instintiva, Noza, como era conhecido, destacou-se na produção de xilos e esculturas, compiladas graças à insistência de artistas e pesquisadores, que lhe desafiaram a produzir obras distintas do seu ofício costumeiro.

Após décadas em um Juazeiro plenamente vivido por ele, entre entalhes matutinos e rondas noturnas, exercendo seu cargo de fiscal do Juizado de Menores, Noza faleceu em São Paulo, para onde foi levado à contra gosto. Sobre a cidade, chamava-a de “purgatório dos vivos”.

Neste último sábado, dia 21, rememorou-se 30 anos de sua morte, distante do Cariri, sepultado como indigente. Na terra que escolheu para si, no entanto, não é esquecido – persiste no trabalho de 150 artesãos, reunidos no Centro de Cultura Popular Mestre Noza, em Juazeiro.

Nesta edição, recordamos a vida e a obra de Noza, “o escultor de Padre Cícero”, através dos trabalhos no centro cultural e das memórias de artistas, como Sérvulo Esmeraldo, e dos pesquisadores Renato Casimiro e Gilmar de Carvalho, que em março de 2014 lançarão um livro de artigos e fotos sobre as esculturas do Mestre.

MAYARA DE ARAÚJO
REPÓRTER

Fonte: Diário do Nordeste



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