Crato (CE): Discurso político do cordel é analisado

O livro "Discurso Político no Folheto de Cordel", resultado de um trabalho de pesquisa no âmbito da linguagem discursiva, focado na análise de dois livretos que circularam em Juazeiro do Norte durante período eleitoral, foi lançado durante esta semana, pela professora doutora da Universidade Regional do Cariri (Urca), Cláudia Rejanne Pinheiro Grangeiro, do Departamento de Letras. O trabalho é vencedor do Prêmio Mais Cultura Patativa do Assaré, do Ministério da Cultura, na categoria Pesquisa em Literatura de Cordel.

De acordo com a pesquisadora, o livro trata de uma análise do discurso político no contexto da cidade de Juazeiro do Norte. Foram utilizados para esse trabalho os folhetos de cordel escritos pelo cordelista Abraão Batista, "Engana-me que eu gosto" e "Engana-me que eu gosto 2", dentre outras fontes de análise como matérias de jornal, panfletos e cartas anônimas aos eleitores.

Os dois polêmicos folhetos circularam na cidade por ocasião das eleições municipais do ano 2000. O primeiro deles foi proibido judicialmente de circular, por trazer imagem e dizeres considerados pela Justiça ofensivos à figura feminina. Trazia também um discurso de "bestaferização", conforme a autora, de demonização da mulher e do comunismo. As análises são norteadas pelas teorias do discurso oriundas dos ´Diálogos e Duelos´ de Michel Pêcheux e a ´Arqueologia do Saber´, de Michel Foucault.

Figura feminina
A partir dos folhetos, a pesquisadora traz todo o material da campanha. A principal análise feita pela escritora, esteve voltada para a representação da figura feminina, pela forma como ela aparece de forma demonizada.

E o discurso é antigo, segundo a autora, e traz junto toda uma leitura discursiva da forma como a mulher é vista. A capa do cordel, por exemplo, contém a xilogravura de uma mulher com a cabeça de medusa, o símbolo do comunismo, o martelo e a foice, associado ao tridente da figura representativa do satanás. "Essa linguagem não é recente, por estar presente em alguns discursos religiosos, figuras da Bíblia, que representam a mulher como bruxa, uma das representações do satanás", diz.

Transformações
Ainda conforme a autora, vivemos na "sociedade do espetáculo", na qual "a mercadoria contempla a si mesma no mundo que ela criou. "Tais transformações atingiram também a fala política. Dos grandes debates ideológicos da década de 1970, passou-se para o império das formas breves e a hegemonia das imagens", destaca.

O trabalho de pesquisa da escritora, que iniciou o dourado em Paris, foi concluído em 2007. Chegou a ser premiado, por meio de edital lançado Mais Cultura, Patativa do Assaré de Literatura de Cordel, em várias categorias, com produção, distribuição e pesquisa. O trabalho foi uma das dez contempladas para publicação nessa categoria de pesquisa em literatura de cordel.

Ela destaca a grande quantidade de pesquisadores na área da literatura de cordel. "É uma das maiores expressões da cultura brasileira para a humanidade. Inclusive com a xilogravura", ressalta. Segundo Rejane, que também trouxe grande contribuição para as artes plásticas. O problema, explica, em relação às pesquisas é a falta de incentivo governamental para publicações do material. "Isso representa uma luta antiga dos cordelistas e dos pesquisadores", diz Cláudia, ao destacar a ineditismo do prêmio, que não teve reedição.

Para ela, a influência do cordel durante a política foi fundamental, e cada localidade tem as suas formas particulares de atuação. "É uma coisa inédita interessante. O cordel não faz parte do cânone publicitário, nem literário, e muito menos político. Mas foi o material mais comentado na época, que trouxe todos esses dizeres", ressalta.

Ela ainda acrescenta a força da linguagem do cordel na região. Parte do doutorado da escritora foi realizada no Centro de Estudos, Discurso, Texto e Comunicação (Cedtec), que é na Paris 12.

Na instituição tem grandes pesquisadores na área do discurso político e sucessores do francês Raymond Cantel, um dos maiores pesquisadores de estudos sobre as línguas portuguesas e da literatura popular brasileira. O maior acervo de literatura de cordel está na Universidade de Poitiers, na França.

Mais informações
Universidade Regional do Cariri (Urca)
Departamento de Letras
Fones: (88) 88356391 / 99126930

ELIZÂNGELA SANTOS
REPÓRTER

Fonte: Diário do Nordeste



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