Barbalha (CE): A festa do santo, dos grupos tradicionais e da folia

Às 17 horas do domingo que abre os festejos à Santo Antônio em Barbalha, marcado pelo hasteamento do Pau da Bandeira, o cortejo de carregadores precisa de um abre alas contundente - com carro, fogos, seguranças e cordas de isolamento - para conseguir chegar à Praça da Matriz. Uma multidão estimada em 300 mil pessoas lota varias ruas do centro histórico do município, tornando um exercício de fé e paciência chegar, com duas toneladas nas costas, ao local do hasteamento.

O dia do cortejo do Pau da Bandeira contabiliza o maior volume de pessoas dos 13 dias de festa. A aglomeração começa ainda cedo, para assistir a missa dedicada a Santo Antônio, no início da manhã. Às 10 horas, muita gente já está à postos para acompanhar o desfile dos grupos tradicionais, reisados, bandas cabaçais, penitentes, vaqueiros, maneiro pau, após a missa, seguidos de shows – com atrações locais e nacionais em palcos montados dentro da cidade, no Largo do Rosário e no Marco Zero, e fora, no Parque da Cidade - que seguem durante a tarde e a noite.

A quantidade de pessoas nas ruas cresce a medida em que o dia vai caindo. No fim da tarde, além do público curioso em ver as homenagens à Santo Antônio, alheios a qualquer programação, há uma confusão de carros com paredões de som e jovens amontoados em volta, garrafas de vodca e uísque debaixo do braço, embalados pela aleatória e original mistura de funks, forrós, música sertaneja, que sai ao mesmo tempo de cada equipamento.

“A cidade se torna pequena para a multidão que se tem. Barbalha tem em torno de 60 mil habitantes e você coloca cinco, seis vezes a população em um só dia”, dá a dimensão o atual secretário da Cultura, Antônio de Luna, responsável pela organização da festa deste ano. Barbalhense, desde os anos 1970 ele acompanha a Festa do Pau da Bandeira e as mudanças que ocorreram ao longo destes anos. “Antigamente, a festa era feita de forma muito mais voluntaria. Não era tão comercial como hoje. As escolas, as duas maiores de Barbalha, que eram o Colégio Nossa Senhora de Fátima e Colégio Santo Antônio, colocavam duas barracas, Abano e Cabana, e disputavam quem apurava mais pra Igreja. Era uma festa bem mais religiosa do que hoje, até pelos costumes da época”, compara, ponderando que ainda se encontra voluntariado na organização da quermesse, das atividades religiosas, mas em menor proporção.

Mudanças
Um dos marcos de reorganização da Festa do Pau da Bandeira aconteceu na própria década de 1970, quando o então prefeito Fabriano Sampaio repensou o evento para dar mais visibilidade a Cidade, agregando novos elementos ao dia do carregamento. “Ele já tinha na época uma preocupação com a cultura popular, com grupos que ele via quando criança.

Segundo ele, no início dos anos 1970, praticamente não se via mais essas apresentações, que estavam restritas as localidades, nos sítios”, lembra o filho de Fabriano, Josep Sampaio, advogado e atual diretor do Colégio Santo Antônio. A intenção era que a festa crescesse, reforça. Os grupos foram mapeados por alunos do colégio Santo Antônio e Nossa Senhora de Fátima e passaram a receber apoio da prefeitura para que se apresentassem na festa. Sobre o período, radialista e ex-prefeito João Hilário, lembra ter sido convidado por Fabriano para animar o cortejo e apresentar os grupos durante os dias de festa. “Me tornei o apresentador da festa, nas apresentações artísticas, ainda sem grandes shows, só com grupos locais e o folclore. Uma noite era o maneiro pau, outra noite o reisado, outra noite os penitentes. E comecei a fazer a locução do Pau da Bandeira, estimulando os carregadores, falando da história da cidade, elevando a autoestima. Aquilo contagiava bastante. Fiz aquilo por 25 anos, mesmo como prefeito”, lembra.

Shows
João Hilário esteve à frente da prefeitura de Barbalha nos anos 80, com um mandato de seis anos e nos anos 1990. O crescimento do público, avalia, aconteceu à medida que a festa foi ganhando projeção na imprensa e foi acompanhado pelo volume de atrações musicais. “No meu primeiro mandato, a festa era feita na praça. Chegamos a receber Luiz Gonzaga, lançando em 1987 a música 'Festa de Santo Antônio'. Falei com Gonzaga, ele tinha gravado músicas com Juazeiro, com o Crato e não tinha ainda contemplado Barbalha. Ele me perguntou se daria certo Alcymar Monteiro fazer a música. Alcymar fez, Luiz Gonzaga gravou”, lembra.

Nos anos seguintes, a festa tomou dimensão tal que, durante a gestão de Rommel Feijó, foi necessária a construção do Parque da Cidade, espaço onde até hoje são realizados os grandes shows. Entre os nomes que João Hilário lembra ter passado pela Festa de Santo Antônio, estão, além de Gonzagão, Luís Melodia, Roberta Miranda, Tribo de Jah, Fundo de quintal, Oswaldinho do Acordeom, Genival Lacerda, Meirinha.

“Em 1992 foi o ano que teve o maior festival, com dois, três grandes shows por noite”, complementa Josep. Fazendo uma interlocução com as ponderações de seu pai (que encontra-se hospitalizado) sobre o desenvolvimento da festa, ele aponta uma preocupação de que a parte religiosa da festa se dilua em meio às atrações profanas. “Uma coisa que ele frisa de diferença entre o passado e o presente é que o cunho religioso era muito mais evidente. Os penitentes, as pessoas olham hoje como se fosse grupo de cultura. Mas existe o lado religioso. A percepção do lado religioso está menor e a festa tomou dimensão tão grande que as vezes os grupos passam despercebidos”, avalia.

Foto: SAMUEL PINHEIRO

Fonte: Diário do Nordeste



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