Cariry Universal: um perfil do cineasta Rosemberg Cariry

Nas paredes do seu ambiente de trabalho, vários cartazes de filmes que produziu, roteirizou ou dirigiu. Alguns são assinados pelos filhos, que também mergulharam nos caminhos da sétima arte. Numa das prateleiras, uma infinidade de troféus estampa a parede. Noutra, diversas esculturas esculpidas em madeira ou feitas de barro remetem à vastidão da cultura cearense. A Cariri Filmes foi o local escolhido como cenário da entrevista. O local é o ninho de pré e pós-produção dos incontáveis projetos do cineasta Rosemberg Cariry. Prestes a completar 60 anos, ele conversou com o Vida & Arte sobre seu passado, suas influências e sobre o dia de amanhã.

Antônio Rosemberg Moura decidiu adotar o nome do território que o construiu. “Cariry foi adotado quando cheguei em Fortaleza, em 1975. Foi um jeito de criar uma ponte entre o Interior e a Capital”, revela. Nascido em 1953 no pacato município de Farias Brito, Rosemberg precisou ir embora aos cinco anos. A cidade passava por uma de suas piores secas, mas o estopim foi o assassinato do prefeito da época. “Meu pai decidiu que ali não era ambiente para criar a família. Eu brincava procurando casco de bala para fazer apito”, lembra. Dali, migrou para o Cedro, mas foi preciso mudar-se novamente - dessa vez uma enchente devastou a região. O Crato serviu de morada. Lá se embebeu descomedidamente do Cariri amado que o batizou.

Antes de chegar ao audiovisual, Rosemberg já havia pisado noutros solos como a literatura e a produção cultural de eventos diversos. O cineasta é, acima de tudo, um entusiasta da cultura popular cearense, de onde tira o suprassumo para suas obras. “Os acontecimentos do Interior marcaram minha vida de forma muito profunda. Passei por momentos líricos, de encantamentos com festas de padroeira, de colégio, de circos pobres, pescarias”, comenta. Do Cariri, foi estudar engenharia em Minas Gerais, mas abandonou a faculdade para retornar ao berço e graduar-se na Faculdade de Filosofia de Fortaleza. “O popular e o erudito me levaram à compreensão da universalidade da cultura. Nossas heranças são híbridas, a cultura popular tem uma sofisticação muito grande”, afirma.

Na capital cearense, durante as décadas de 1970 e 1980, encabeçou o movimento Nação Cariri, com o qual trouxe pela primeira vez para Fortaleza os shows de Patativa do Assaré. “Ele era meu compadre. Nesses eventos, a gente não distinguia Interior e Capital. Tínhamos ícones do sertão misturados aos shows de rock, blues, às performances. Misturávamos de Mayakovsky à Cego Aderaldo”, brinca. Rosemberg afirma que procura entender a cultura não como algo pejorativamente folclórico, estereotipado ou intocável. “A cultura popular está presente hoje não como um exotismo, mas pela sua ludicidade, pela crítica que traz e está diluída na estética contemporânea”, argumenta.

Rosemberg soma direção e roteiro em mais de dez longas, além uma série de curtas e documentários. Para os próximos meses, já planeja lançamento de dois novos filmes que estão em conclusão: Folias de Reis e Pobres Diabos, além de uma mostra sobre sua obra no Festival Santiago Álvarez, em Cuba. Todos os trabalhos sempre com a marca muito evidente de sua identidade. Viajador apaixonado pela diversidade, ele se titula como resultante dos encontros que vivenciou durante as idas e vindas mundo afora. “Estou sempre em mudança. Eu sou o encontro. Minha arte é a tradução disso. Sou um caminhante percebendo a vida sem um ponto fixo de chegada, como um rio, onde as águas se movem impermanentes”, finaliza.

Filmografia de Rosemberg Cariry
  • Caldeirão Da Santa 
  • Cruz Do Deserto (1986)
  • A Saga do Guerreiro Alumioso (1993)
  • Corisco & Dadá (1996)
  • A TV e o ser-Tao (1999)
  • Pedro Oliveira, o Cego que Viu o Mar (1999)
  • Juazeiro, a Nova Jerusalém (2001)
  • Lua Cambará, Nas Escadarias do Palácio (2003)
  • Cine Tapuia (2006)
  • Patativa do Assaré - Ave ou poesia (2007)
  • Siri-Ará (2008)
Gênios da raça
Ele planeja para os próximos meses o lançamento de dois novos filmes: Folias de Reis e Pobres Diabos

Rosemberg também é autor de quatro livros de poesia. O primeiro deles, Despretencionismo, foi publicado em 1975

Ícone
“Rosemberg está relacionado à história do audiovisual no Ceará. É o maior ícone do nosso audiovisual. Sempre olhou para o universo do sertão e seus ícones. É um amigo com quem posso dialogar sempre”. Halder Gomes, cineasta

Pioneiro
“O Rosemberg é o principal cineasta da história do Ceará tanto ele pela qualidade quanto pela atividade pioneira. Ele foi abrindo veredas diante de muitas dificuldades. E estabeleceu uma produção cinematográfica aqui. Ele estabeleceu uma linguagem coerente, bem construída, trabalhando desde a questão social ao imaginário da nossa cultura”
Oswald Barroso, teatrólogo

DANILO CASTRO
REPÓRTER

Fonte: O Povo



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