MPF pede arquivamento de inquérito contra paleontólogos

O Ministério Público Federal (MPF) solicitou arquivamento do inquérito policial, que trata da prisão em flagrante de dois pesquisadores na área da Paleontologia. O fato aconteceu no último mês de maio. A solicitação foi feita à 16ª Vara da Justiça Federal, com sede em Juazeiro do Norte. A polêmica em torno da questão foi causada principalmente por uma má interpretação da lei pela fiscalização, segundo o MPF.

A legislação assegura a presença dos pesquisadores, sejam eles nacionais ou estrangeiros, com bolsas de pesquisas patrocinadas por órgãos de fomento nacional, instituições de reconhecimento, e tenham feito o comunicado ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

Segundo o procurador federal, Rafael Ribeiro Rayol, todos esses procedimentos foram cumpridos pelos pesquisadores Alex Kellner e o francês Romain Amiot, que estavam atuando na região. "Na verdade, faltou a interpretação correta em razão até de desentendimentos e um melhor conhecimento da lei, que insere várias portarias ministeriais, com muitos detalhes", afirma o procurador. Ele ressalta que ficou claro, nos documentos apresentados pela coordenação do projeto, que o estrangeiro era bolsista do CNPq, nesse caso não necessitando de autorização do DNPM e nem do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) para atuar no local indicado pela coordenação da pesquisa.

Além do arquivamento, é solicitada a devolução das 236 amostras de fósseis e pó de rocha, material retido na Delegacia de Polícia Federal, em Juazeiro, e a devolução da fiança de 10 salários mínimos, cobrada a cada um dos pesquisadores. Eles foram detidos na tarde do dia 2 de maio, no Aeroporto Orlando Bezerra de Menezes, e liberados na noite do dia seguinte, mediante o pagamento da fiança. As amostras deverão ser entregues a Universidade Regional do Cariri (Urca), detentora do Museu de Paleontologia, em Santana do Cariri, e instituição na qual está inserida a pesquisa.

A prisão do paleontólogo austríaco naturalizado brasileiro, Alex Kellner, e de Romain Amiot - que veio especialmente colher as amostras de pó de rocha para levar ao Rio de Janeiro e, em seguida, conforme a coordenação da pesquisa "Estudos Sistemáticos e Paleoecológicos da Fauna de Vertebrados das Formações Crato e Romualdo (grupo Santana) da Bacia do Araripe", sob autorização do DNPM, para a França - já chegou a causar diversos prejuízos ao estudo paleontológico na região. O próprio DNPM local admite que muitos pesquisadores, após o episódio, ficaram receosos quanto à realização de projetos na região.

O professor doutor em Paleontologia, Álamo Feitosa, coordenador da pesquisa na qual os estudiosos estavam ligados, afirma que há a necessidade de devolução desse material com urgência, pois devem ser apresentados resultados até outubro ao CNPq. Foram quase três meses de paralisação da maior escavação paleontológica controlada no Nordeste, iniciada no ano passado, em Araripe. "Isso sem falar nos prejuízos causados ao próprios pesquisadores, que foram colocados no patamar de traficantes de fósseis", diz Álamo. Só para essa fase da pesquisa foram investidos R$ 22 mil.

O pesquisador francês, afirma o coordenador, sequer se encontrava com amostras de fósseis, e sim, sedimentos.

As situações, até então não esclarecidas, colocaram em evidência nomes de grandes instituições, como o Museu Nacional do Rio de Janeiro e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), as quais o pesquisador Kellner está ligado, a Urca e o DNPM, além do órgão de pesquisa. Álamo Feitosa afirma que os prejuízos em relação ao tempo, dinheiro e principalmente do contato com o estudioso francês refletem de forma negativa para a paleontologia da região.

O geoquímico Romain Amiot é um dos raros pesquisadores na área de caracterização isotópica, com estudos de reações químicas, usando o oxigênio 18 e o carbono 13, para detectar a paleotemperatura e a paleosalinidade com o material colhido na região. Os sedimentos seriam examinados no seu laboratório, na França. Segundo Álamo, um dos mais modernos do mundo, que inclusive receberia estagiárias brasileiras envolvidas com a pesquisa.

"Por conta dessa situação, e da decepção de Amiot, que já esteve realizando pesquisas em várias partes do mundo, o prosseguimento desse trabalho poderá estar prejudicado", afirma.

O coordenador critica também o rigor extremo da fiscalização do DNPM na região, no que diz respeito aos pesquisadores nacionais, e até estrangeiros ligados às pesquisas realizadas no Brasil. Ao mesmo tempo, questiona a presença há alguns anos, de pesquisador estrangeiro, a exemplo de David Martius, que esteve na região com visto também de turistas, não era ligado a nenhuma instituição de pesquisa, e, no entanto, tem até trabalhos publicados sobre os fósseis do Araripe. Para Álamo, a decisão do MPF está de acordo com todas as questões que foram levantadas pela coordenação da pesquisa, quanto à legalidade do desenvolvimento dos trabalhos, inclusive da coleta do material.

"O ministério público não teve nenhum tipo de influência para chegar a essa decisão. Agiu de forma técnica e dentro da lei", avalia o professor.

Álamo ainda destaca a necessidade da fiscalização local conhecer a lei. "No mínimo, existe uma ignorância e um despreparo dos agentes de fiscalização", afirma, ao acrescentar que não houve boa vontade por parte do órgão fiscalizador para resolver o problema.

"Isso causou prejuízos à imagem de pessoas sérias, à pesquisa e às pessoas que queiram trabalhar com a Paleontologia na região", frisa. Para o chefe do escritório do DNPM, em Crato, Artur Andrade, a decisão do MPF deve ser cumprida, porém, é questionável perante a lei.

Mais informações
Ministério Público Federal (MPF)
Rua Jonas de Sousa, 60
Lagoa Seca
Juazeiro do Norte - Cariri
Telefone: (88) 3571.1833

ELIZÂNGELA SANTOS
REPÓRTER 

Fonte: Diário do Nordeste

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