Em crise, jornalismo da Record é usado pela Igreja Universal - Por: Maurício Stycer*

Inteiramente reformulado nos últimos anos, o departamento de jornalismo da Record vive o seu pior momento neste final de 2011. Ao mesmo tempo em que o “Jornal da Record” contabiliza os seus números mais baixos de audiência no ano, outro noticiário da emissora, o “Domingo Espetacular”, se vê acusado de praticar mau jornalismo contra um grupo religioso concorrente da Igreja Universal.

Vice-líder no horário, o “Jornal da Record” caiu para terceiro,  superado pelo SBT, ou viu o concorrente empatar no Ibope alguns dias em novembro. A audiência média do principal noticiário da emissora em outubro foi de 6,7 pontos, a mais baixo no ano.

O programa já trocou de horário inúmeras vezes em 2011. Em julho, deixou de concorrer com o “Jornal Nacional” e passou a ser exibido às 19h40. As mudanças decorrentes da passagem-relâmpago de Datena pela emissora e os Jogos Pan-Americanos cobraram um preço alto. Desde então, a sua audiência vem caindo. Durante o Pan, o JR foi exibido excepcionalmente às 18h e depois dos Jogos voltou ao horário do primeiro semestre, começando às 20h30.

No esforço de recuperar a audiência perdida, o noticiário está dando mais ênfase a assuntos de comportamento e saúde, em detrimento de reportagens mais aprofundadas ou de investigação.
Mas o sinal mais eloqüente de que algo grave ocorre na Record foi a exibição, no domingo, 13, de uma reportagem de 39 minutos sobre um fenômeno religioso, encontrado em diferentes práticas neopentecostais, que o “Domingo Espetacular” ironizou chamando de “cai-cai”. O apelido maldoso deve-se ao fato de que, tocados de leve por um pastor durante os cultos, os fiéis desfalecem, como que por mágica.

Na prática, a reportagem foi um ataque impiedoso aos pastores que fazem apologia desta prática, com o objetivo de alertar eventuais fiéis de que o “cai-cai” é, na verdade, charlatanismo ou obra do demônio. Contrariando uma regra elementar do bom jornalismo, a Record não ouviu nenhuma voz  em defesa dos religiosos atacados ao longo dos intermináveis 39 minutos da matéria.

Dentro da emissora, o ataque ao “cair no espírito”, como também é conhecida a prática, foi visto como uma vitória de setores da Igreja Universal do Reino de Deus que defendem a utilização da Record no ataque aos adversários religiosos e, também, no esforço de recuperar o número de fiéis, que estaria em queda.

A reportagem exibida no “Domingo Espetacular”, de fato, contraria a essência de todo discurso sempre defendido pelos principais nomes da emissora nos últimos anos, de que existe uma separação total entre a IURD e a Record.

Este tem sido o tom das raras manifestações públicas tanto de Edir Macedo, fundador da igreja e presidente da emissora, quanto de seus principais executivos, como Honorilton Gonçalves, vice-presidente artístico e de programação, e Douglas Tavolaro, vice-presidente de jornalismo.

Procurada para comentar a reportagem do “Domingo Espetacular” e a queda a audiência do “Jornal da Record”, a emissora informou que a abordagem sobre o “cair no espírito” foi “jornalística” e que o telejornal  sofre “oscilações” normais no Ibope, mas continua com vice-líder no horário.

*Mauricio Stycer é jornalista e crítico do UOL. 

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